A fragmentação da informação a partir da multiplicação dos meios tecnológicos de comunicação traz a necessidade de uma nova maneira de lidar com o saber. Renomados gurus corporativos apregoam: compartilhe conhecimento!, trabalhe colaborativamente!, amplie seu repertório!, inove! Olhando para os lados, podemos ver na expressão dos ouvintes comentários como “ok, senhores, eu entendi. Até concordo. Mas o que devo fazer agora?”.
Paralelamente a essa movimentação “top-down“, podemos verificar o crescimento exponencial de uma ferramenta que pode levar à emergência de novos arranjos nas interações de saber, e eventualmente solucionar a problemática de viabilizar o compartilhamento sem prejudicar o indivíduo. Estou falando dos weblogs.
Um weblog nada mais é do que um website com pequenas mensagens organizadas cronologicamente e com uma interface de edição simplificada, através da qual seu autor pode inserir novos “posts” sem a necessidade de saber HTML. Estima-se que já existam cerca de um milhão de weblogs em todo o mundo.
John Robb, presidente e COO da Userland Software, disseminou o conceito de knowledge logs ou k-logs, ou seja, a utilização de weblogs no ambiente corporativo com a finalidade de estimular a colaboração e a organização pessoal do conhecimento. Mais do que uma mera publicação pessoal, um k-log pode ser encarado como um companheiro do processo de aprendizado e do trabalho cotidiano. Sua estruturação cronológica leva a uma existência paralela ao próprio decorrer da vida.
Quando o compartilhamento de informação incorpora-se aos rituais diários – ler, clicar com o mouse, digitar um pequeno comentário e pronto, está compartilhado – podemos constatar o surgimento de um novo tipo de relação com o conhecimento.
Uma das características marcantes dos k-logs é o que podemos chamar de catalisação de insights. Uma vez que temos a possibilidade de publicar, a cada momento, qualquer idéia, por menos estruturada ou viável que seja, e revisitá-la posteriormente, acessar os comentários de terceiros e possivelmente reconstruí-la de acordo com novas condições, é criado um ambiente de inovação e aperfeiçoamento continuado. Podemos perceber também que a percepção de tempo se altera com a referência e a recuperação de posts passados. Se estivermos falando em uma comunidade de webloggers interagindo livremente, esse efeito é potencializado. Por exemplo, eu posso usar um insight que outro weblogger teve há três meses para construir uma idéia hoje, e esta pode ser reaproveitada daqui a um ano. A interconexão de idéias de diferentes autores é um grande estímulo a uma cultura colaborativa, e com o tempo torna-se uma fonte de matéria-prima para a inovação.
Da mesma forma, a possibilidade de referir-se a pedaços de idéias como objetos em si (mais especificamente do que artigos, publicações ou obras completas) permite uma maior “manuseabilidade” das idéias de cada um, favorecendo a bricolagem e a criatividade. A chamada PKM, Gestão de Conhecimento Pessoal, encontra nos k-logs uma maneira de se realizar: arquivando informações à medida que elas aparecem e depois tendo a possibilidade de pesquisar por elas, contextualizá-las, agrupá-las em categorias e expandir seu significado.
A criação de comunidades de k-logs também mostra um caminho possível para outro desafio da Gestão do Conhecimento: a transformação de informação em conhecimento. Acredito que a contextualização em três direções – histórica, pelo formato cronológico dos weblogs, semântica, com a natural coerência nas opiniões e na escolha de assuntos do autor, e social, com a interação com outros webloggers, é fundamental para esse processo.
A comunidade desempenha um papel decisivo no sucesso de coletivos de k-loggers: mais do que a postagem individual de conteúdo, a consistência de uma comunidade online de klogs é dada pelos hyperlinks e comentários cruzados entre seus integrantes. Um coletivo de weblogs é uma maneira excelente para acompanhar um mundo em constantes transformações, através da integração e diálogo de diferentes pontos de vista em tempo real. Há um novo conceito de hierarquia, baseada no histórico de publicação e comentários de cada indivíduo. Além disso, novos membros da comunidade podem trilhar os weblogs dos mais experientes como verdadeiros guias para o aprendizado.
Um weblog pode ser uma excelente ferramenta para o marketing pessoal, refletindo a capacidade, os pontos de vista e a rede de contatos de seu autor. A abertura ao diálogo, o relacionamento direto com os leitores, a honestidade nos pontos de vista e a diversidade das fontes são alguns valores prezados para esse tipo de utilização.
Uma reflexão mais aprofundada sobre a utilização dos weblogs pode levar o indivíduo a questionar: onde está minha mente, uma vez que minhas idéias espalham-se no espaço e no tempo, misturando-se com as idéias de outros? Podemos vislumbrar aí o sentido real da virtualização que Pierre Levy define como inteligência coletiva: uma base de circulação de informações que estende a capacidade da mente humana, e que pode ser utilizada como fonte comum que leva a diversas construções de significado, de acordo com a necessidade de cada um. O modo de produção de software livre segue, de certa maneira, essas premissas. A questão que precisamos enfrentar é transpor esse modo de produção para outras áreas do conhecimento. A utilização de weblogs é um bom começo.