As empresas gastam biliões sempre que empregados e gestores não partilham o seu conhecimento. Mas mudar significa entender porque é que eles não partilham.
Há alguns anos falei numa conferência para um grupo de executivos das áreas de informação, conhecimento e comunicação corporativa. Estava a falar de mudança em vez de gestão de conhecimento. Mas, no final, perguntei “Quantos de vocês se sentem confortáveis em partilhar o que sabem?”. Numa audiência de 200 pessoas, apenas se ergueram 3 mãos. Claramente, se as pessoas responsáveis por gerir, criar, promover e liderar o conceito de partilha de conhecimento se sentem desconfortáveis ao fazê-lo, estamos perante um grande problema – um problema humano, não um problema tecnológico.
E contudo, quando olhei para a investigação realizada, a maioria da literatura assenta na tecnologia; uma parte na cultura organizacional; mas nenhuma nas inibições e motivações individuais para a partilha.
Existe uma quantidade enorme de conhecimento em todos os níveis de uma organização: sobre o que os clientes necessitam, como os processos podem ser melhorados, ou que novos produtos e serviços podem ser desenvolvidos. Ao tentar capturar e comunicar esta sabedoria cumulativa, as organizações investiram centenas de milhar de dólares em portais corporativos, software colaborativo e intranets orientadas para a GC.
Mas a partilha de conhecimento é mais do que a tecnologia que a suporta, mais do que uma estratégia de negócio que visa optimizar a experiência e perícia de uma empresa, e ainda mais do que uma mudança cultural da era industrial para a da informação. A partilha de conhecimento tem a ver, antes de mais, com as pessoas.
“Conseguir que as pessoas partilhem realmente aquilo que sabem é agora necessário, se vai começar a deixar que a Internet modernize a organização”, diz Larry Prusak, o top guru do conhecimento da IBM.
No modelo perfeito da partilha de conhecimento, os gestores são valorizados não porque sabem mais do que os seus empregados, mas porque lhes conseguem rapidamente comunicar o que sabem e porque conseguem que eles façam o mesmo entre si. Os líderes constróem ambientes de confiança e respeito mútuo onde a contribuição criativa é nutrida, e os empregados em todos os níveis entendem que, ser bem sucedido neste mundo em rede, requer cada vez mais colaboração.
Isto é o ideal. A realidade é algo diferente. Completei recentemente um inquérito a 200 gestores sobre o estado da partilha de conhecimento nas suas empresas, que confirma o que muitos praticantes da GC têm vindo a experimentar. Muitas vezes os líderes de equipa guardam informação e rateiam-na só quando é necessário, os executivos pedem input colaborativo quando o que realmente querem é aprovação para decisões já tomadas, e as pessoas não partilham o que sabem devido a um conjunto de inibidores pessoais e organizacionais.
Estas barreiras humanas subestimam a importância de considerar as questões humanas na gestão de conhecimento antes de depender da tecnologia para melhorar a comunicação.
Isto está a tornar-se uma realidade bastante cara. A International Data Corporation desenvolveu uma métrica para medir o que eles referem como o déficit de conhecimento (knowledge deficit). Essa métrica captura os custos e deficiências que resultam da repetição do trabalho intelectual, do desempenho abaixo da média e da incapacidade de encontrar fontes de conhecimento. Segundo esta métrica, o déficit de conhecimento nas empresas da Fortune 500 custa-lhes, anualmente, 12 biliões de dólares.
Além disso, as melhores práticas e lições aprendidas têm o potencial de poupar às empresas mais biliões de dólares. Kenneth Derr, o anterior CEO da Chevron, viu a situação da seguinte forma: “Cada dia que uma nova ideia não é usada, é uma oportunidade perdida. Temos de partilhar mais, e temos de partilhar mais depressa. Eu digo aos empregados que partilhar e usar melhores práticas é a coisa mais importante que podem fazer.”
É bonito de dizer mas difícil de fazer. Há muitas razões pelas quais as pessoas são relutantes em partilhar o que sabem. Estão ocupadas e não têm tempo para partilhar. Esquecem-se de partilhar. Não querem o trabalho e a responsabilidade adicional subjacente à partilha. São colocados em projectos que não merecem a sua contribuição (um termo inglês para isto é WOMBAT – waste of money, brains and time). Mas, por mais comuns que estas condições possam ser, não foram as respostas mais frequentes na minha pesquisa.
Aqui estão as cinco razões principais pelas quais as pessoas não partilham o que sabem:
1. As pessoas acreditam que o conhecimento é poder
“Se eu sei algo que tu não sabes, eu tenho uma vantagem sobre ti.”
(Estas citações são de gestores durante a minha pesquisa.)
Os sistemas educacionais estão desenhados para desencorajar a partilha de informação. Se eu te dou uma resposta a uma questão num exame, e se sou avaliada numa curva, eu coloquei-me em desvantagem. Muitas pessoas ainda lutam com a ideia de que “se te digo o que sei, perco algo”. Quando a avaliação, promoção e recompensa das pessoas numa empresa se baseiam em números relativos, a percepção é de que a partilha de conhecimento vai (sempre) reduzir as hipóteses de sucesso pessoal.
Assim, a primeira solução óbvia é alterar o sistema de recompensa. Encontrar formas de reforçar e recompensar a partilha de conhecimento. Reconhecer e promover pessoas que aprendem, ensinam e partilham. E penalizar aqueles que não o fazem. Em todas as empresas bem sucedidas nesta área, guardar conhecimento e não construir sobre as ideias de outros têm visíveis, e por vezes sérias, consequências na carreira. Na American Management Systems, nivelar o que se sabe, educando colegas, escrevendo, ajudando os outros e ensinando os mais novos, é a forma de se construir uma reputação como líder mundial e de ser promovido a partner.
De seguida, é necessário entender que há agentes motivadores mais poderosos que o dinheiro. Para 25 mil técnicos da Xerox em todo o mundo, contribuir para a base de dados Eureka com dicas de manutenção é uma oportunidade de se tornarem conhecidos como peritos mundiais. Ser pessoalmente identificado com a solução de um problema difícil pelos representantes da Xerox em todo o mundo, é o maior incentivo que leva as pessoas a contribuir. Na Xerox, eles demonstram que guardar conhecimento não é mais sinónimo de poder, mas que a reputação ganha através da partilha de conhecimento é.
2. As pessoas sentem-se inseguras sobre o valor do seu conhecimento
“Sinto que as pessoas tendem a subestimar a experiência da vida, que o intelecto tem sido demasiado louvado, e para algumas pessoas sem uma educação formal, é-lhes difícil acreditar que podem trazer valor de uma forma bem diferente.”
O meu último livro, “Ghost Story: A Modern Business Fable”, apresenta um personagem que não partilha conhecimento porque acredita que não tem nada para contribuir. Dot, a heroína do livro, é um exemplo daquilo a que os educadores se referem por “competência inconsciente”. Basicamente, ela não sabe o que sabe. E, porque nas reuniões de equipa é a mais júnior e se sente intimidada, acredita que a sua opinião não tem valor. (No final, claro, é a sua coragem, força, e sabedoria nata que ganha.)
Há mini-culturas em todas as organizações. Independentemente da cultura global da empresa, os gestores e os líderes de equipa podem criar um clima de colaboração nos seus grupos de trabalho. E o melhor dos líderes fá-lo encontrando tempo e fazendo o esforço necessário para que as pessoas se sintam seguras e valorizadas. Eles realçam os pontos fortes das pessoas ao mesmo tempo que encorajam a partilha de erros e lições aprendidas. Eles estabelecem objectivos claros e clarificam os papéis individuais. Eles ajudam todos os membros a reconhecer o que cada um deles traz à equipa. São exemplo de abertura, vulnerabilidade e honestidade. Contam histórias de sucessos de grupo e desafios pessoais. E, acima de tudo, encorajam e respeitam a contribuição de todos.
3. As pessoas não confiam umas nas outras
“Eu não conheço pessoalmente os outros membros da equipa e por isso não confio neles.”
Uma cultura de colaboração tem de se basear na confiança. Porém, muitas vezes, com a pressa de começar um novo projecto, reunimos grupos de pessoas e dizemos-lhes “vão trabalhar”. Esta abordagem não se revela produtiva já que o grupo não teve tempo de descobrir os pontos fortes e fracos uns dos outros, nem de desenvolver uma visão e um entendimento partilhado do projecto. Além disso, a mudança de empregados, os despedimentos em massa e as aposentações antecipadas fazem com que seja extremamente difícil desenvolver a confiança mútua necessária à construção de relações sólidas por toda a organização.
Mesmo a motivação para que os indivíduos contribuam conhecimento para uma base de dados electrónica depende, em grande parte, do relacionamento entre os membros que usam o sistema. Se os indivíduos não confiam o seu conhecimento aos outros, ou não confiam que os outros vão retribuir da mesma forma, é pouco provável que o sistema venha a ser eficaz. A tecnologia pode facilitar a partilha de conhecimento mas é a confiança que o torna possível.
Uma vez que as pessoas são naturalmente relutantes a partilhar informação com outras quando não as conhecem suficientemente bem, a solução começa por criar oportunidades para que as pessoas se encontrem e interajam tanto em ambientes formais como informais. E não as apressem. Dêem tempo às pessoas para que criem relacionamentos, avaliem a confiança que uns e outros merecem, e aprendam bem os pontos fortes e fracos uns dos outros para que se adaptem a eles de forma construtiva. Dedicar algum tempo, no início de um projecto, à construção deste “capital social” aumenta a eficácia da equipa mais tarde.
A confiança é frágil. Construída lentamente ao longo do tempo, cresce à medida que as pessoas correm pequenos riscos e esperam que esses actos de fé sejam justificados e reciprocados. E, a não ser que haja reservas de confiança, esta pode ser destruída de um momento para o outro. As boas notícias é que, quando a confiança é sólida, ela torna-se a força que dá energia aos elementos da equipa, que liberta contribuições criativas e torna o trabalho conjunto produtivo e agradável.
4. Os empregados têm medo de consequências negativas
“Eu tinha medo que a minha ideia fosse ridicularizada se fosse um pouco exagerada, ao invés de ser tomada como um ponto de partida no brainstorming.”
Há alguns anos, numa viagem de avião de São Francisco para Toronto, sentei-me ao lado de Linus Pauling, duas vezes vencedor do prémio Nobel. Quando lhe perguntei sobre o maior obstáculo à inovação ele respondeu que era “qualquer processo – educacional, científico, ou organizacional – que pára o fluxo de ideias.”
O conhecimento é altamente conceptual. É accionado por circunstâncias, tal como quando as pessoas certas se encontram na altura certa e descobrem, durante a conversa, que cada uma possui informação de que a outra precisa. Assim, duas coisas parecem evidentes: 1) a partilha de conhecimento tem uma qualidade circunstancial, e 2) é da combinação (e colisão!) de ideias que os rasgos criativos geralmente ocorrem.
Torna-se então crucial eliminar as barreiras que se opõem ao fluxo livre de ideias. Todas as pessoas têm conhecimento que é importante para alguém, e nunca se sabe quem vai dar uma ideia que se irá tornar parte essencial da solução. Quando as ideias são ridicularizadas, criticadas ou ignoradas, as pessoas sentem-se ameaçadas e “castigadas” por contribuir. A sua reacção típica é afastarem-se da conversa. Ao contrário, quando as pessoas são livres de fazer perguntas “tolas”, questionar regras e avançar sugestões novas – mesmo que bizarras -, então a partilha de conhecimento torna-se um processo criativo de mistura de opiniões, experiências e perspectivas diversas, ao encontro de um objectivo comum.
5. As pessoas trabalham para outras pessoas que não dizem o que sabem
“Pessoalmente, tive mais problemas com gestores que guardam informação, do que tive com colegas ou membros de equipa.”
Em qualquer organização, a forma como a informação é tratada determina se ela se torna num obstáculo ou num incentivo à partilha de conhecimento. Na Era Industrial, a gestão da informação era, por norma, deliberadamente obstrutiva. Não se esperava que os empregados contribuíssem para a tomada de decisões nem para a resolução de problemas e, por isso, a informação que lhes era dada restringia-se ao mínimo que a gestão sentia ser necessário para o seu trabalho específico.
Hoje, a colaboração informada é vista como essencial para o sucesso organizacional, e os líderes têm que assegurar que todos os empregados têm acesso a todos os factos sobre todos os aspectos de negócio – por mais aterrorizadores que sejam – incluindo finanças, produtos/serviços concorrentes e estratégia organizacional. Além disso, isto requer um maior investimento em programas de educação e desenvolvimento pessoal de forma a que os empregados tenham suficiente experiência prática para usar os dados partilhados.
(Tradução de Ana Neves.)
Ao ler o artigo da Carol Goman, não pude deixar de aplicar todos os motivos relacionados à realidade que vivencio diariamente ao mapear e documentar processos de trabalho. Gostaria de ressaltar ainda o aspecto destacado por ela quanto ao foco nas dificuldades (e facilidades) tecnológicas, em detrimento dos aspectos pessoais. De fato, há uma supervalorização da tecnologia, enquanto se subestima todo o lado humano do conhecimento. “O conhecimento navega melhor através das pessoas” – Esta frase que ouvi recentemente sintetiza exatamente onde deve ser feito maior investimento, com o apoio, sim, da tecnologia, mas não como fim, mas como meio. Outro aspecto fundamental, ao qual atribuiria peso “2” é o fato de as pessoas não saberem que sabem o que sabem. Acredito que como fruto do empobrecimento do ensino, desqualificando as fontes de maneira generalizada (estou falando do Brasil) e também com a multiplicidade de fontes (o que é bom pelo lado da diversidade), misturando conteúdos mais ou menos estruturados e embasados cientificamente, acabamos tendo muito conhecimento pulverizado, ficando difícil separar o “joio do trigo”. Nesse sentido, a Internet é, ao mesmo tempo, herói e vilão desta história. Acho que precisamos mesmo é de exemplos concretos e bem sucedidos de compartilhamento de conhecimento, trazendo este conceito (às vezes tão etéreo) para mais perto do nosso dia a dia.
Trabalho na área de engenharia de automação e construção industrial, e estou muito interessado na gestão do conhecimento, mas o que normalmente se encontra como fonte de informação trata da tecnologia da informação.
O artigo da Carol Goman reforça a experiência vivida e reafirma a necessidade de quebra de muitos paradigmas e também de uma nova atitude das organizações principalmente de cima para baixo.
Atitudes que demonstrem transparência e credibilidade são determinantes e muito difíceis, pois deverá representar uma nova forma de ver o mundo e as organizações, temos a obrigação de pensar diferente.