O Reino do Conhecimento é Conquistado e Construído por Crianças

Estive pensando a respeito do comportamento adequado das pessoas frente aos desafios da gestão do conhecimento e duas boas posturas me vieram à mente. A primeira deriva do provérbio Chinês que afirma que antes de começar o trabalho de modificar o mundo, dê três voltas em torno de sua casa. Isto sugere que antes de pensar em mudar a empresa através das práticas de gestão do conhecimento, os gerentes e executivos precisam olhar à sua volta, avaliar seus comportamentos frente ao conhecimento, rever suas práticas e posturas diante dos desafios do conhecimento e avaliar se há coerência entre suas atitudes e os princípios de gestão do conhecimento.

Isto porque a diferença entre o discurso e a prática tem se revelado ao longo do tempo como um dos maiores inimigos da gestão do conhecimento. A gestão do conhecimento, antes de tudo, é feita de posturas, comportamentos e atitudes positivas, portanto, exemplares. Como uma pessoa espera mudar a empresa sendo incapaz de mudar as pequenas coisas à sua volta? Como pode um gerente afirmar-se comprometido com a gestão do conhecimento sendo incapaz de promover a retenção de seus melhores talentos? E como pode não ver a importância estratégica nisso? Como pode um gerente defender exaustivamente a aquisição de um software para gestão do conhecimento e ser incapaz de ouvir seus funcionários e de prestar atenção no que eles tem a dizer? Assim, a primeira grande lição que todos os gerentes tem a aprender sobre gestão do conhecimento é: Antes de começar o trabalho de modificar a empresa, devo dar três voltas em torno da minha mesa.

A segunda postura favorável que lembrei é que o melhor de gestão do conhecimento ocorre à nossa volta quando nos tornamos crianças novamente. Na passagem Bíblica de Mateus 18:2 está descrito: Jesus, chamando uma criança, colocou-a no meio deles, e disse: Em verdade vos digo que se não vos converterdes e não vos fizerdes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus. De maneira similar, imaginei que conhecer o reino do conhecimento exigirá de nós o mesmo esforço. Se queremos alcançá-lo deveremos nos tornar como crianças. Mas por que dessa analogia? Que características essencialmente infantis seriam importantes à gestão do conhecimento? Vamos a elas!

Infelizmente ao identificar os inimigos do conhecimento e observar as características humanas que favorecem a aprendizagem, pude observar que muitas dessas características relevantes se fazem menos presentes na vida adulta. Desse modo, concluí que se queremos tirar proveito dos processos de gestão do conhecimento em nossas empresas, devemos nos tornar como crianças. Entre as várias particularidades positivas do comportamento infantil, muitas delas parecem atrofiar, hibernar, perder o vigor, desaparecer das pessoas em sua vida adulta, certamente fazendo-lhes muita falta na vida profissional, afetando a eficácia, criatividade, produtividade, inovação e conseqüentemente, a atuação em gestão do conhecimento.

Só os curiosos de espírito aprendem e só os resolvidos vencerão as dificuldades do aprendizado. O coeficiente da curiosidade sempre me fascinou mais que o coeficiente da inteligência. E. S. Wilson

A primeira característica muito peculiar às crianças e também muito relevante ao conhecimento é a curiosidade. As crianças fazem pergunta o tempo todo. Além do alto interesse, muito diferente da maioria dos adultos, elas não temem fazer perguntas e nem as conseqüências delas. A curiosidade como fonte do saber é fundamental à própria vida. Para Salvador Panker a juventude de um ser humano não se mede pelos anos que tem, senão pela curiosidade que armazena. Segundo Ralf Smith, uma criança faz em média 125 perguntas curiosas por dia, enquanto o adulto médio faz apenas seis.

A curiosidade é um componente importante não só para as empresas, mas relevante à própria vida humana, e desse modo, não deve ter seu vigor, intensidade e força reduzidos com o passar dos anos. A seguir incluí uma lista de outras características facilmente observáveis nas crianças. Procure analisar o quão útil elas seriam na vida adulta e o quanto elas poderiam apoiar as práticas de gestão do conhecimento em sua empresa.

As crianças trocam informações, elas contam histórias, elas são sociáveis, fazem amizades facilmente e conversam com estranhos sem constrangimentos. Elas são humildes e com isso estão sempre abertas ao aprendizado e a experiências novas. Elas confiam em seus amigos e assim conseguem ensiná-los e compartilhar coisas e experiências come eles. Elas não temem dizer não sei. Elas fazem arte como conseqüência do experimento. Elas não têm medo de errar ou se sujar. Elas fazem perguntas espontâneas constantemente. Ela não tem preguiça e ao invés disso tem muita disposição. Elas são ótimas professoras e não só praticam o ensino freqüentemente como sabem ensinar seus coleguinhas. Elas aprendem novas habilidades muito rápido. Elas são ingênuas e por não saber o que é “possível” e o que é “impossível”, levam grande vantagem sobre os adultos que são fortemente influenciados por julgamentos e limites. Elas aprendem brincando e brincam de aprender. Elas são inquietas e são inventivas por natureza.

As crianças são donas de uma certa desordem criativa. Isso as favorecem em relação aos adultos, que gostam de organizar as coisas à sua volta. Esta organização convencional dos adultos pode aprisionar os insights criativos. As crianças não respeitam limites criados pelos adultos. Por desconhecê-los, simplesmente os desprezam completamente. As crianças vivem no ócio e na abstração, ambos extremamente úteis aos processos criativos. As crianças experimentam. Elas são perseverantes e tentam várias vezes, tantas quanto forem necessárias para satisfazer suas dúvidas. Elas são sensíveis. Não sofrem quedas criativas, influenciadas por pressões de tempo e de responsabilidade.

As crianças são criativas, gostam de inovar e inventar. Elas são guiadas pelo instinto e intuição. As crianças são menos preconceituosas. Elas não respeitam paradigmas. Elas são determinadas. Demonstram interesse por várias áreas distintas. Elas detestam rotinas e procuram se livrar delas. Elas possuem ampla capacidade para fantasiar. Elas possuem um espírito inquieto. São libertas de julgamentos de valor. Possuem coragem e confiam em seus extintos. As crianças dizem a verdade. Elas aprendem por conta própria, qualidade fundamental para os adultos, pois resulta em crescimento contínuo.

O escritor Ernesto Sábato certa vez escreveu que o artista deveria ser uma mistura de criança, homem e mulher. A gestão do conhecimento por sua vez, tal como na letra de Gonzaguinha, deve ficar com a pureza das respostas das crianças. Seu reino é um lugar onde se vive e não tem a vergonha de ser feliz e se canta a beleza de ser um eterno aprendiz. Para os propósitos de gestão do conhecimento e de aplicação condicional do conhecimento, todos eles tinham ampla consciência quando nos aconselharam a ser como as crianças. Será que temos prestado a devida atenção nestes homens?

2 comments

  1. Rosangela Maciel (Organizarte) 12 Março, 2003 at 22:26 Responder

    Parabéns ao Portal KMOL e obrigada Saulo Porfírio Figueiredo pelo artigo, isso só vem a reforçar o Nosso Pensamento.

    É impressionante como a grande maioria dos adultos têm medo (me-do é o medo de se dar) da Simplicidade, da Clareza, da Transparência, da Verdade, do Prazer, do Compartilhar, da Cooperação, da Integração, da Integridade (no sentido de totalidade).

    Descobrir que: “o caminho da sabedoria? É simples: errar, e errar, e errar novamente, mas menos e menos e menos”.

    É preciso reaprender a aprender o Outro Caminho – O CAMINHO DA POSSIBILIDADE.

  2. Ferdinand 16 Janeiro, 2011 at 00:10 Responder

    O artista poderia se dar mais a este comportamento do que o técnico que trabalha em ambiente altamente político de nossas empresas.

    Existe um provérbio antigo da Sérvia que em livre tradução fica mais ou menos assim: “Se pretendes falar a verdade, tenhas pronto seu cavalo!” Isto mostra a nossa realidade adulta, existem barreiras auto-impostas sim, mas não esqueça as barreiras reais vigentes na sua organização.

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