Aprendizagem: porque as Máquinas somos Nós!

Estamos atravessando uma era de Humanismo, exatamente dessa forma, com H maiúsculo, para designar o retorno em estilo avançado aos últimos séculos medievais na história da humanidade, durante os quais o conhecimento e a cultura circulavam com mais liberdade e o homem passava a perceber a si próprio. Isso porque hoje os conceitos que mais aparecem em evidência no mundo corporativo são aqueles que giram em torno de temas “humanos”, como a própria gestão do conhecimento, o capital intelectual, o coaching, o desenvolvimento organizacional, a educação corporativa, o mentoring, a gestão da mudança, entre outros.

Um desses temas, a aprendizagem organizacional, ou learning organization, trata da capacidade de uma empresa se reinventar no atual cenário de incertezas quanto ao futuro e de mudanças na realidade, criando condições de se perpetuar no mercado a partir de vantagens que só a mesma possa ter, de acordo com seus recursos humanos disponíveis, as pessoas. Isto é, juntando pessoas e grupos de trabalho – e por que não, de aprendizagem – em busca de criatividade, inteligência e conhecimento que possa alavancar o negócio de uma organização. Apesar de ter sido popularizada nos anos 90 por Peter Senge em seu livro A Quinta Disciplina, a aprendizagem organizacional é uma filosofia bastante antiga, circa anos 30, com Kurt Lewin e, posteriormente, Chris Argyris, nos anos 50. Entretanto, podemos ir ainda mais longe no tempo e relacionar o conceito de AO com o que o professor L.S. Vygotsky, nos anos 20, pesquisou na educação de crianças. A diferença aqui é que o espaço físico não é a organização, mas a escola. A abordagem, porém, não muda, se adapta, e esse professor russo já falava em dois níveis de desenvolvimento, um real e outro potencial, sendo este último a capacidade de aprender a partir do contato com outro indivíduo, assim como a possibilidade de adquirir informações, habilidades, atitudes e valores em interação constante com outras pessoas. (Entende agora por que as empresas falam tanto de relacionamento interpessoal nos processos de seleção?) Essa digressão é para mostrar que, em relação à aprendizagem, os indivíduos serão diferentes devido a sua personalidade e experiências ao longo da vida, mas a forma como a mesma se dá, inclusive no campo profissional, cria raízes, em cada um, lá no início, na infância.

Portanto, voltando a Senge, o autor que popularizou esse conceito, para que se chegue a uma learning organization, as pessoas em uma empresa necessitam de cinco disciplinas de aprendizagem organizacional, a saber: domínio pessoal, modelos mentais, pensamento sistêmico, visão compartilhada, e aprendizado em equipe. Essas habilidades, quando conjugadas, exercem um papel definitivo na forma de atuação das empresas, que poderão chegar, segundo o autor, à inovação e a formas mais conscientes de se adaptar ao ambiente externo. Todavia, é fundamental que a aprendizagem seja permanente, pois as pessoas têm uma grande capacidade natural em aprender cada vez mais, ainda que seja preciso que isso seja despertado e se torne uma curiosidade que a impulsione com determinação àquilo que elas querem aprender ou, ao menos, ao que seja necessário a sua área de competência. Um dos pontos principais nesse processo é lembrar que cada um nasce com um determinado “dom”, mas todos podem ter proficiência através da prática.

Com esse pensamento, dentro da aprendizagem, mas rumo a mais uma digressão, convém perceber o que o economista Adam Smith, em seu livro A Riqueza das Nações, informou ao tratar da relação entre a divisão do trabalho e o aumento da produção. De acordo com o autor, a primeira causa para o aumento da produção era “o aumento de destreza de cada um dos trabalhadores”, pois aqueles que durante toda a vida (ou, aceitemos, boa parte dela) fizeram as mesmas tarefas, aprenderam mais sobre essas e se tornaram mais rápidos no seu desenvolvimento. Smith ainda afirmou que a divisão do trabalho é limitada tão-somente pela dimensão do mercado ou pela abrangência da capacidade de troca, o que pode ser análogo às organizações de aprendizagem modernas.

De volta ao nosso momento, caberia dizer, com certa frieza e ausência de maior análise ou aprofundamento teórico qualquer, que as máquinas somos nós, sem dúvida! Máquinas humanas, de aprendizado, cujos valores e potencialidades influenciaram até mesmo a “linha de produção” de Smith e as “organizações que aprendem” de Senge. Não apenas na vida pessoal, mas também na vida organizacional, aprender é a palavra-chave para o desenvolvimento que, de individual e particular, torna-se comum e geral e faz a grande diferença no mundo, hoje. Talvez mais tarde, para que possamos ser bem sucedidos levando junto as organizações em que nos situamos, pode ser um grande diferencial ter o domínio dessa competência, a capacidade de aprender, a fim de que possamos nos preparar para os novos tempos pois, conforme certa vez afirmou um dos expoentes europeus do planejamento estratégico, Arie de Geus, ex-vice presidente de planejamento da Royal Dutch/Shell, a habilidade de aprender mais depressa do que os concorrentes pode ser a única vantagem competitiva nos dias atuais.

(Originalmente publicado em http://www.capitalintelectual.blogger.com.br/index.html. Reproduzido com autorização do autor.)

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