Acções estratégicas para a gestão de conhecimento e mudança

Muito se fala na crise. Crise ou não crise, a verdade é que a situação económica do nosso país (e não só) está a passar uma fase menos boa e carregada de grandes incertezas.

Enquanto que algumas organizações vêem nisso fonte de preocupação, outras detectam o momento actual como uma oportunidade de mudança e investimento. Uma situação económica envolvente menos favorável pode dar às organizações a possibilidade de:

  • alargar para outros mercados
  • adicionar novos produtos e serviços ao ser portefólio
  • apostar num novo modelo de negócio
  • idealizar e implementar novos processos internos.

A análise destas opções deve ser feita de forma consciente e suportada pelos melhores dados, informação e conhecimento. Mas, onde estão eles? Não sofrem as organizações, no geral, de um deficiente acesso a dados, informação e conhecimento de qualidade, em formatos adequados e na altura em que deles necessitam?

Pois bem, uma adequada estratégia para a gestão de conhecimento é de grande importância em todas as fases da vida de uma organização mas revela-se crítica em alturas como esta, em que a organização precisa de rapidamente analisar alternativas, considerar as implicações e definir as acções a implementar.

Estas acções estratégicas geralmente requerem mudanças operacionais significativas. Por exemplo, uma aposta em novos mercados pode requerer a construção de novas fábricas num outro país; ou a criação de novos produtos pode necessitar de acesso a fontes de informação diferentes; ou um novo modelo de negócio pode implicar o recrutamento de pessoas com um conjunto distinto de qualificações; ou novos processos internos podem ser sinónimo de novas máquinas ou sistemas informáticos. Tudo isto são mudanças significativas que, regra geral, têm de acontecer em simultâneo com a actividade normal da organização.

Isto é, o processo de mudança é, normalmente, algo que coexiste com a actividade rotineira da organização. E isto… bem, isto, para a maioria dos colaboradores da organização, significa duas coisas principais:

  1. trabalho adicional (a grande maioria das vezes não remunerado)
  2. impactos pessoais directos, como por exemplo novas responsabilidades, nova equipa de trabalho, ou até mesmo, novo local de trabalho.

Ambos podem ter impactos pessoais demasiado importantes para que sejam ignorados e, quando o impacto é visto como negativo, é vital que a organização o perceba e conceba um plano de comunicação capaz de reconhecer estes aspectos mas também de realçar os aspectos positivos da mudança.

Ignorar os receios dos colaboradores traça um caminho direitinho para a resistência ou, na melhor das hipóteses, para a falta de apoio à mudança organizacional pretendida.

Assim, a decisão de mudança na organização deve fazer-se sempre acompanhar de um plano de mudança. E o que é que consta de um plano de mudança?

Para além dos aspectos específicos à mudança a implementar (por exemplo, construção de nova fábrica, criação de alianças locais, etc.), o plano de mudança deve incluir um elemento também ele fundamental: um plano de comunicação.

Este plano de comunicação, que pode ser construído por uma taskforce multidisciplinar, deve ser elaborado depois de analisados vários pontos. Por exemplo:

  • de que forma a mudança irá afectar os colaboradores (pode haver grandes diferenças entre colaboradores de acordo com a sua função, idade, competências, localização, agregado familiar, etc.)
  • quais as opiniões dominantes dos colaboradores que irão ser afectados (também aqui pode haver grandes diferenças dependendo de, por exemplo, nível de escolaridade, idade, ambições profissionais, etc.)
  • quais os canais de comunicação disponíveis e quais os mais adequados para os diferentes “grupos” identificados anteriormente (apresentações, vídeos online, emails, newsletters em papel, reuniões um-para-um, etc.).

Considerando tudo isto, a organização pode então preparar um plano detalhado e intenso de comunicação, garantindo que todos os colaboradores percebem:

  • a razão da mudança (“esta mudança é importante para a organização porque…”)
  • que a organização sabe os impactos que a mudança vai causar a nível pessoal dos colaboradores (“temos consciência de que esta mudança vai significar…”)
  • que apesar dos impactos negativos há benefícios ou vantagens (“mas a mudança é importante, para cada um de vocês, porque…”)
  • que há um programa de apoio / formação / aconselhamento disponível para cada colaborador.

Outros dois aspectos importantes na definição de programas de mudança são:

  • assegurar que a mudança não tem só impactos nos colaboradores de um determinado nível (nem só nos níveis mais baixos, nem só nos níveis mais altos) e evidenciar esses impactos comuns
  • tanto quanto possível, envolver os colaboradores (ou, mais realisticamente, representantes dos colaboradores) na construção do plano de comunicação e no processo de mudança.

Relativamente a este último ponto, e dependendo da dimensão da mudança e da duração do programa de mudança, pode ser vantajoso criar um grupo de “champions” que, representando os seus colegas, possam dar ideias e ser envolvidos não só no planeamento mas também na execução das tarefas definidas no plano. Eles serão os olhos e os ouvidos da organização, mas serão também um canal (mais ou menos) informal para transmissão de actualizações. Os “champions” poderão, efectivamente, ser, eles próprios, o canal principal de comunicação bidireccional durante o processo de mudança.

Com crise ou sem crise, as organizações podem ter necessidade ou optar por mudar ou diversificar o seu rumo. Nesta altura, é importante que o conhecimento esteja disponível para apoiar a decisão e que os processos de conhecimento estejam oleados para apoiar a organização numa altura em que tudo tem de acontecer rapidamente sob pena de usarem demasiados recursos ou de serem ultrapassados pela concorrência.

É também fundamental que a organização dê a devida importância ao que pensam e sentem os colaboradores: afinal, eles serão peças fundamentais durante e após o processo de mudança. Um plano de mudança deve incluir um plano de comunicação que os ouça e que fale com eles numa linguagem simples e directa, conquistando a sua atenção e conseguindo apelar para os factores racionais e emocionais que controlam as suas acções e decisões.

Nota: Este texto foi originalmente publicado na quinta edição da revista POSI Mag, uma publicação do Curso de Pós-Graduação em Sistemas de Informação (POSI) do Instituto Superior Técnico. Clique aqui para aceder a esta e outras edições da POSI Mag.

4 comments

  1. Ferdinand 8 Abril, 2011 at 23:21 Responder

    Acabo de ler FLIRTING WITH DISASTER – Why Accidents are rarely Accidental, do Marc Gerstein. Ele comenta alguns dos maiores desastres das últimas decadas ( Chernobyl, Enron, Katrina, e a crise financeira de 2008 etc…). Especialmente nas crises financeiras tem gente que sabe o que vai ocorrer, sempre aparecem pessoas com opinião abalizada avisando, só que o sistema não quer saber, seguem em frente com um sistema falido até que não dá mais. Agora é Portugal que pede socorro, a Espanha diz que não tem risco de ser arrastada, não tenho conhecimento claro do cenário, mas poria as barbas de molho. Os próprios Estados Unidos estão empurrando com a barriga os problemas deles. Quando não der mais, todos pagamos.

    O quadro é sempre o mesmo. A alta administração por razões impublicáveis resolve correr riscos não razoáveis. E o faz pois não pagará as contas.

    O sistema que impera, tanto nas empresas como nas nações ainda é selvagem.

Leave a reply