I Leadership Summit Lisbon - boas vindas

Vamos Falar de Liderança (I Leadership Summit Lisbon)

No dia 26 deste mês, tive o prazer de assistir ao I Leadership Summit Lisbon. Nas próximas linhas resumo um pouco do evento, revelo o que mais me surpreendeu e partilho as ideias que certamente irei reter.

Where do we go from here?” era o mote para a primeira edição deste evento. Trata-se de um evento inspirado no Fórum de Davos e que parte do princípio de que, como disse António Saraiva no discurso de abertura, a liderança é fundamental para moldar o mundo em que queremos viver. Num discurso algo politizado, o presidente da CIP falou:

  • da importância da liderança por exemplo;
  • da capacidade de adaptação à mudança como determinante para o sucesso;
  • da aposta insuficiente do Estado na qualificação de “ativos” para que melhor se consigam adaptar à mudança (sou só eu que detesto a palavra “ativos” em referência às pessoas?);
  • do atual relativismo ético sem precedentes;
  • da capacidade dos líderes de inspirar sacrifícios em prol de um bem comum.

Gilles Lipovetsky, filósofo francês, refletiu sobre o futuro do consumismo. Falou das características do hiperconsumismo atual, e frisou que o consumismo é cada vez mais non stop, a la carte, e emocional. Isto é, as pessoas estão sempre a consumir, esperam uma experiência de compra personalizada, e consomem muitas vezes em busca de emoções e não por necessidade. Terminou a sua apresentação aludindo a modelos de consumismo que não se baseiem na contínua compra de mais produtos e serviços. Isto trouxe-me à memória o conceito de economia circular que ouvi da fantástica Ellen MacArthur no evento anual da COTEC em 2016.

Seguiu-se Marisa Miraldo, professora no Imperial College London. Adorei a paixão com que contou uma história de números que convincentemente:

  • alertou para o impacto da doença na economia pessoal, organizacional e nacional;
  • provou que os fatores ambientais – poluição, stress, alimentação, tabaco, etc. – condicionam mais do que a genética a saúde das pessoas;
  • mostrou a necessidade de soluções personalizadas;
  • lembrou o potencial das inovações tecnológicas.

A sua narrativa concluiu com as características que se esperam dos diferentes líderes no ecossistema da Saúde – os policy makers, os prestadores de cuidados de saúde, os gestores, etc.

E por falar em narrativas… Edson Athayde, publicitário brasileiro há muitos anos em Portugal, tem estudado o uso de narrativas como ferramenta de comunicação. Ele descreveu narrativas como veículos que transportam exemplos que evitam a repetição de erros passados. Não servem só para isso, digo eu, mas esta é, sem dúvida, um dos grandes benefícios das narrativas. (Veja o livro Putting Stories to Work de Shawn Callahan.)

Tirando partido da sua própria história nas pistas da Fórmula 1, Mark Gallagher é hoje convidado a inspirar plateias e a orientar empresas.

A indústria da Fórmula 1, como outras, passou momentos muito difíceis e teve de se reinventar. Várias das empresas nesta área viram-se obrigadas a diversificar o seu negócio. Para que as empresas se possam reinventar precisam de dados, disse Mark Gallagher. Eu acrescento que precisam também de ter consciência da existência desses dados, e de conhecimento para os analisar e sobre eles decidir.

Mas se houve empresas que diversificaram o negócio para escapar à não dependência da Fórmula 1, também houve empresas que escolheram diversificar entrando para esta indústria. Foi o caso da Red Bull, por exemplo. Esta empresa, conhecida pelas suas bebidas energéticas e com fortes competências de liderança, comprou uma empresa de Fórmula 1 em crise e aplicou essas competências para a conduzir ao sucesso. Uma espécie de inverso do que se passou com a compra da Zappos pela Amazon.

Mark Gallagher vem de uma indústria que, literal e metaforicamente, anda a alta velocidade. Por isso, disse, as empresas da Fórmula 1 dependem de ter um grupo de pessoas que aprendeu a libertar o seu potencial, e de ter uma abordagem ágil.

A agilidade foi, aliás, a ideia chave destacada por Nadim Habib. Na sua divertida intervenção, este professor da Nova SBE começou por referir as três principais causas de stress no trabalho: demasiado trabalho, demasiados emails e demasiadas reuniões.

O ritmo de mudança e o enorme volume de canais e informação, também referidos por António Saraiva, têm trazido grandes desafios às empresas. As chefias não estão a conseguir processar tudo isto e vão arrastando decisões porque, habituadas a um modelo de controlo, não delegam essa responsabilidade aos seus colaboradores. O resultado é que, num contexto cada vez mais rápido, as empresas estão cada vez mais lentas.

Stephan Morais, fundador do hub de Lisboa da Global Shapers, falou da importância da meritocracia como fundamental para manter as colaboradores empenhados e motivados. Inês Santos Silva e Cristina Fonseca concordam com esta ideia da meritocracia (não fosse este um valor da comunidade de Global Shapers e não fossem elas membros dessa comunidade). Ambas referiram também o quão fundamental é haver alinhamento dos valores pessoais com os da organização. A geração mais nova, disse Cristina Fonseca, gosta de se divertir mas empenha-se totalmente no trabalho e ignora o modelo “das 9 às 5” se sentir que está a contribuir para algo em que acredita num ambiente alinhado com os seus valores.

Uma outra ideia que começou a surgir sobretudo com os oradores da parte da tarde foi a da liderança como algo que não tem necessariamente de estar no topo. Esta ideia surgiu nas palavras de:

  • Miguel Pina e Cunha (Nova SBE) que descreveu a liderança como a arte da influência e que, como tal, pode estar em todo o lado;
  • Sérgio do Monte Lee (Deloitte), que falou de liderança descentralizada;
  • José Miguel Leonardo (Randstad), ao dizer que “a liderança não é um posto – é uma competência”;
  • António Saraiva (CIP), que também falou de liderança como ação e não uma posição.

A importância dos erros foi outro tema recorrente. Surgiu com:

  • Edson Athayde, que vê as narrativas como forma de transformar erros passados e evitar erros futuros;
  • Mark Gallagher, que disse que “mistakes fuel future success”;
  • Sara Alves, vencedora de um concurso da Randstad e que subiu ao palco para partilhar a sua visão do que é liderança;
  • Aida Chamiça, que frisou o medo que os líderes (gestores) têm de errar, levando-se muito a sério.

Quem não se leva muito a sério e acredita que com uma dose de humor os problemas ficam mais leves, é Ricardo Araújo Pereira. Foi apresentado como o mais conhecido humorista português da atualidade e foi a melhor forma de terminar o dia. Sou fã de como ele aplica o seu saber de áreas tão diversas como a religião, a pintura, a história, a literatura, para confrontar hábitos e comportamentos com um humor acutilante.

Por exemplo, referiu três formas de aldrabice: as tautologias, os truismos (momento em que me lembrei de Mark Gallagher a dizer que para terminar em primeiro, primeiro era preciso terminar) e a utilização de palavras noutros idiomas (como disse Ricardo Araújo Pereira, todos protestam quando o patrão faz despedimentos mas ninguém protesta quando o CEO faz downsizing).

Concluiu com o convite aos líderes para que utilizem mais o humor e a sua capacidade de olhar uma situação de várias perspetivas para considerar diferentes opções antes de agir ou tomar uma decisão.

O balanço geral que faço do evento é bastante positivo. De tudo o que ouvi

Gosto da ideia da Tema Central e da Global Shapers Lisbon de criar um evento para falar de liderança e gostei de como procuraram explorar diferentes contextos de liderança. Tive pena por não se ter ido mais além de algumas ideias chave mas já amplamente conhecidas do que é ser líder. Teria gostado de ouvir histórias – as tais histórias de que se falou no evento – do que é ser líder, do que é ser bem liderado, das dificuldades que se colocam aos bons e aos maus líderes, do que é ser líder quando não se é “chefe”, etc.

Ainda assim, aprendi bastante e certamente não irei esquecer de algumas “coisas” (aqui diria key takeaways mas o Ricardo Araújo Pereira acusar-me-ia de estar a ser aldrabona):

  • comprar serviços também é consumir (Gilles Lipovetsky);
  • atualmente a qualidade deve ser vista em termos de qualidade ética, económica e ecológica (Gilles Lipovetsky);
  • quem é que tem mais poder – quem conta uma história ou quem a ouve? (Edson Athayde);
  • Mark Gallagher descreveu que como chave de sucesso “um grupo de pessoas que aprendeu a libertar o seu potencial”. Isto é bem diferente daquilo que geralmente se ouve que é o líder bem sucedido que é capaz de extrair o potencial da sua equipa;
  • vários autores descrevem a comédia como sendo tragédia + tempo. O Ricardo Araújo Pereira descreveu a comédia como sendo tragédia + distância. Essa distância pode ser temporal, física ou, como ele diz, distância que eu consigo interpor entre mim e mim mesmo;
  • a Global Shapersthe power of youth in action;
  • a revista Líder, lançada durante o evento e à qual ficarei atenta.

Para terminar, e porque aprendi bem a lição com a Patricia Lee Eng e o Paul Corney, aqui está uma listinha daquilo que mais me surpreendeu, pela positiva (+) ou pela negativa (-) no evento:

  • (-) não haver wi-fi no espaço do evento – estranho nos dias que correm e num evento onde tanto se falou da velocidade a que as coisas acontecem e da necessidade de estar sempre ligada;
  • (+) a apresentação da Marisa Miraldo;
  • (-) não haver qualquer utilização aparente das redes sociais para fazer ecoar o evento;
  • (+) o tom descontraído do evento e o caráter tão bem-humorado de muitas das apresentações;
  • (-) não ter havido qualquer espaço de debate com o público – num evento sobre liderança onde tanto se falou da necessidade de parar com o modelo de comando e controlo, ficou estranho haver um comando e um controlo por parte do “palco”;
  • (+) os horários, no geral, foram bastante bem cumpridos;
  • (-) o tema da ética na liderança não ter sido mais falado – só sobressaiu nas intervenções de António Saraiva e de Gilles Lipovetsky;
  • (-) penso que fui a única pessoa a usar o Twitter para ir narrando o evento ao longo do dia (usando a #LSL2017). As únicas reações que tive nesse canal foram de pessoas estrangeiras e de um professor português. Surpreende-me que não haja (mais) líderes portugueses a usar o Twitter, a potenciar esta (ou outra) rede social para ir partilhando a sua visão. Sinto uma oportunidade perdida e sinto que era importante explorar o conceito de working out loud. Afinal, partilhar nas redes sociais seria uma atitude de líder mas também uma forma de assumir liderança 😉

2 comments

  1. Sonia Goulart 6 Outubro, 2017 at 20:52 Responder

    Excelente relato Ana, com indicações de questões relevantes e alguns bons insights. Acompanho o tema de formação de lideranças, principalmente na área pública, há alguns anos e a mudança de foco do gestor como aquele que proporciona a descoberta do potencial da equipe, para a equipe, que ao atuar em conjunto, descobre seu potencial coletivo e individual, me parece ser hoje a questão mais emergente. Grata pelo compartilhamento de seus registros. Um abraço!

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