A Vodafone dispensa apresentações. O gigante das telecomunicações móveis conta em Portugal com quase 6 milhões de clientes registados no serviço celular e com mais de 1500 colaboradores.
Uma das grandes equipas da Vodafone Portugal é a de Network Services Support, responsável pela operação e suporte de equipamentos de rede e que, entre outras funções, presta apoio de segunda linha aos clientes da empresa. Em 2007 a equipa percebeu que muito do seu tempo era gasto a prestar apoio à primeira linha de suporte e que isso os impedia de concentrar os seus esforços noutras áreas mais diferenciadoras. Assim, foi nessa altura que, com o objectivo principal de reduzir o tempo gasto no apoio à primeira linha de suporte, decidiram criar algo que lhes permitisse disponibilizar o seu conhecimento.
Foi aí que nasceu o Portal. Um nome bem simples para algo bem complexo, completo e, aparentemente bastante eficaz.
Foi com prazer que me desloquei à sede da Vodafone Portugal para conversar com Paulo Carvalho, Manager da equipa de O&S Transport & Services e quem esteve por trás do Portal, e com Hernâni Borges de Freitas, actual responsável pela manutenção e contínua melhoria do Portal.
O Portal assenta em três tipos de conhecimento: o conhecimento de arquitectura, o conhecimento de acção e o conhecimento de inovação.

Figura 1- O portal tenta relacionar três tipos de conhecimentos: aquilo que se sabe, que é estrutural, aquilo que está acontecer diariamente e que muda constantemente e o que é desenvolvido através da inovação, de novos projectos e ideias
O conhecimento de arquitectura apoia-se numa ontologia definida internamente com base na linguagem e na forma de trabalhar da organização, e numa série de regras que relacionam os termos dessa ontologia. Assim, os projectos têm actividades; os processos podem registar incidentes; uma determinada equipa pode fazer parte de outra; etc.. Esse relacionamento facilita a navegação dos utilizadores pelo Portal, permite antecipar as suas questões e necessidades, e permite a criação de menus contextuais.

Figura 2- Todos os nós do portal estão ligados a outros nós através de relações semânticas
O conhecimento de acção tem a ver com o grande propósito do Portal: o conhecimento nele contido deve permitir aos colaboradores agir e tomar as melhores decisões. Isso torna-se possível de várias formas das quais destacamos duas:
- Para além da ontologia que serve de pano de fundo para todos os objectos do sistema, os objectos de conteúdo podem ser “descritos” com palavras-chave (tags) dos colaboradores. Para além das tags simples que qualquer pessoa pode introduzir, existem também smart tags que servem para agrupar conjuntos de tags simples que os utilizadores considerem relacionadas ou para englobar determinados objectos de alguma forma relacionados entre si.
- O dashboard inicial, isto é, o que os colaboradores encontram quando entram no sistema pode ser configurado de acordo com uma hierarquia (baseada na ontologia) desde o genérico, ao dashboard da equipa ou ao individual. Esta configuração permite às equipas e às pessoas, criar um ambiente com janelas directas para a informação que lhes é mais relevante e que melhor apoia a sua actividade. Muito ao jeito do iGoogle, os utilizadores podem ver uma lista de widgets disponíveis e arrastá-los para criar o seu ambiente de trabalho no Portal.
O conhecimento de inovação está relacionado com o anterior mas está mais directamente ligado com a utilização do conhecimento disponível para a inovação de processos e serviços. Neste âmbito, uma secção do Portal chamada Brainstorm e assente na metodologia dos Six Thinking Hats, de Edward de Bono, conduz os colaboradores numa espécie de jogo onde são pontuados pelas suas contribuições. Os pontos são posteriormente utilizados para a criação de um ranking. Paulo Carvalho já há algum tempo que inclui a participação das pessoas da sua equipa como factor de avaliação de desempenho e está agora a encorajar os seus colegas para que façam o mesmo noutras equipas.

Figura 3- Cada chapéu representa um tipo de conteúdo que pode ser capturado
Apesar de aparentemente o sistema de pontos poder sugerir uma valorização de quantidade de conteúdo, tal não é necessariamente verdade: são também atribuídos pontos de acordo com o número de vezes que um contributo é lido, servindo como indicador de qualidade e de contraponto ao algoritmo de pontuação.
O Portal está construído sobre Drupal, uma plataforma open source de gestão de conteúdo. Essa foi a opção feita em 2007 e deveu-se, essencialmente, à estrutura de dados que caracteriza essa ferramenta, nomeadamente, “o facto de cada peça de informação ter um conjunto de funcionalidades e propriedades semelhantes que ajudam os utilizadores e os programadores a assentar o seu comportamento sempre nas mesmas bases. Além disso é um CMS construído de raiz a pensar na extensibilidade, uma vez que muitas das ideias e pretensões não seriam possíveis de implementar se isso não acontecesse. Por último, o facto de ser uma ferramenta open source permite um maior conhecimento de toda a plataforma e um maior controlo quanto a integrações com outros sistemas da empresa”, diz Hernâni. A experiência está a ser muito boa e a equipa parece estar já totalmente ambientada à ferramenta.

Figura 4- Todos os artigos têm uma timeline associada que permite acompanhar as últimas alterações e discussões sobre esse item
Apesar de assente em Drupal, o Portal é fruto de muito trabalho de desenvolvimento para reflectir as necessidades específicas da organização. As necessidades chegam normalmente de quem utiliza o Portal, sendo posteriormente analisadas e consideradas para ciclos de desenvolvimento de duas semanas. As novas funcionalidades raramente são disponibilizadas para todos os colaboradores em simultâneo, servindo a equipa de Paulo Carvalho como cobaia para muitos deste novos desenvolvimentos. Hernâni salienta que “este facto permite que qualquer ideia seja testada rapidamente e aperfeiçoada por várias pessoas numa fase em que ainda é possível realizar alterações, evitando que se despenda demasiado tempo com ideias que não vão funcionar. Até obter uma versão final há muitas funcionalidades que passam por dois ou três ciclos.”

Figura 5- Através de visualização em nuvem é possível observar como os nós se relacionam
Se numa primeira versão do Portal, a Vodafone Portugal optou por utilizar o Drupal out of the box no que diz respeito ao design, esta segunda versão tem um design muito leve e agradável que cativa o interesse sem retirar o foco do conteúdo.

Figura 6- O dashboard pode ser personalizado através da instanciação de widgets adaptados às necessidades dos colaboradores (clique para ampliar a imagem)
O desenvolvimento está hoje a cargo de uma pessoa, Hernâni Freitas, que se dedica a tempo inteiro a este projecto. Em conjunto com Paulo Carvalho constituem a equipa do Portal.
O Portal é actualmente utilizado por cerca de 650 colaboradores de 20 equipas. O alargamento a mais pessoas e equipas far-se-á ao ritmo do interesse e dos pedidos. Quando uma nova equipa solicita acesso ao Portal, é identificado um “champion” nessa equipa. Essa pessoa recebe apoio directo de Hernâni Freitas e fica depois responsável por guiar os seus colegas e servir de ponto de ligação entre a sua equipa e a equipa do Portal.
A postura da equipa do Portal não é a de obrigar as equipas a uma forma específica de utilização do Portal. Ao invés disso, diz Hernâni, “sugere-se casos de sucesso de outras equipas e tenta-se alinhar as necessidades comuns partindo da mesma base. Isto introduz um forte factor de motivação ao permitir que os colaboradores tenham o ownership sobre como utilizam o portal, como o desenham e como expõem o seu trabalho aos outros. Permite muitas vezes aproveitar um certo efeito positivo e viral sobre as melhores práticas ao expô-las aos olhos de todos tornando-as mais uniformes e aceites, evitando a duplicação de esforços e fazendo com que nasçam das reais necessidades dos colaboradores.”
O investimento é hoje considerado como justificado e o que surgiu como uma ferramenta de apoio a uma equipa, está hoje na lista dos elementos críticos da empresa, isto é, na lista das “coisas” que mais impacto teriam se deixassem de existir.
Paulo Carvalho refere que há métricas internas para avaliação do impacto do Portal, dizendo que, num processo específico, o Portal permitiu reduzir em 90% o número de pedidos de apoio provenientes da primeira linha de suporte.
Os próximos passos para o Portal são o enriquecimento da ontologia e a extensão da ideia de jogo a todas as áreas para que não fique restrita à área de inovação.

Figura 7- Através de um tradicional cliente de microblogging é possível acompanhar a timeline pessoal
O que distingue o Portal da Vodafone Portugal de muitos outros sistemas corporativos que já vi:
- o facto de ter sido construído com base em necessidades práticas mas fortemente enraizado em conceitos teóricos
- a forma de construção: pequenos desenvolvimentos graduais em resposta a necessidades expressas por colegas
- a integração com uma aplicação de microblogging interna que permite receber informação e alertas do Portal, bem como enviar
- informação para o Portal ao incluir os identificadores dos objectos de conteúdo a que se refere.