A reforma de um colaborador é um acontecimento que, apesar de previsível, parece apanhar a maior parte das organizações de surpresa. Quando se dão conta, já é tarde de mais: a pessoa já saiu sem que tivesse havido um esforço consciente para garantir que o seu conhecimento e a sua experiência ficariam, tanto quando possível, disponíveis na organização.
Não é de estranhar, por isso, que a retenção seja um dos processos de conhecimento mais fracos nas organizações portuguesas, como revela o Estudo de Gestão de Conhecimento em Portugal 2019.
Uma abordagem estruturada à retenção de conhecimento é importante, mas na sua impossibilidade, ou pelo menos num imediato, há pequenas ações que podem fazer a diferença.
É o caso de uma simples iniciativa que está a ser levada a cabo por uma equipa da ANQEP, I.P. – Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional.
No momento em que uma experiente colaboradora começou a contar os dias para a sua reforma, a chefe da sua equipa, apercebeu-se do impacto gigante desta saída.
Ao longo dos últimos 12 anos, esta colaboradora tem contribuído para muitos projetos da ANQEP, I.P. Nesse processo, desenvolveu muitas competências, formou muito conhecimento, aprendeu muitas lições, estabeleceu muitos contactos e criou redes que sabe ativar no momento certo, dependendo da situação.
Se nada fosse feito, esta riqueza, este conhecimento tácito, sairia porta fora no final deste ano quando a senhora se reformar.
Foi por isso que a sua diretora pensou num conjunto de ações a realizar ao longo deste ano para preparar a equipa e a organização para a reforma daquela colaboradora.
O primeiro passo foi identificar os assuntos sob a sua gestão e dividi-los em parcelas.
Essas parcelas têm sido o foco de várias sessões organizadas para partilha da informação e do conhecimento associados. Nestas reuniões, em que participam pessoas da sua equipa e não só, a colaboradora faz uma apresentação inicial e depois responde às questões dos colegas.
Em conjunto, os participantes procuram depois fazer uma sistematização da informação partilhada.
Para além disto, e ciente da saída daquele valioso membro, a chefe da equipa pôs duas pessoas a trabalhar com a colega nos seus vários projetos, procurando uma boa compatibilidade de personalidades para que a comunicação e partilha sejam eficazes.
Finalmente, a colaboradora tem tido uma preocupação continuada de registar por escrito o histórico de alguns temas trabalhados pela ANQEP: o foco principal tem incidido no registo do contexto e do argumentário associados às decisões tomadas.
Este processo de transferência e externalização de conhecimento no momento de reforma de um colaborador, não está institucionalizado. Aconteceu neste caso. E está a correr muito bem pela personalidade e disponibilidade desta pessoa: do gosto que tem de ajudar e da sua dedicação à ANQEP.
Apesar de parecer uma iniciativa óbvia e simples, nem sempre as organizações têm esta preocupação. Importa assim valorizar quem o faz e, com isso, motivar outras organizações, outros profissionais, para que também o façam.
Na conversar que tive com a diretora, chefe da equipa da colaborador que se vai reformar, deixei algumas sugestões de pequenas ações que poderiam aumentar o impacto desta iniciativa. Nomeadamente:
- procurar que nas reuniões realizadas para partilha de informação e conhecimento, se identifiquem boas práticas que possam ser registadas e disponibilizadas para informar projetos futuros;
- se possível, tentar transformar estas lições aprendidas em templates, guiões, check lists, que se tornem instrumentos de referência e trabalho na organização;
- conseguir que, ao invés de ser a colaboradora a escrever a memória dos projetos principais em que participou, sejam colegas a entrevistá-la e a registar o sumo dessa conversa – isto porque as pessoas sabem sempre mais do que aquilo que se lembram de escrever.
Para finalizar, sugeri também que, pouco antes da colaboradora sair, façam uma reflexão sobre todo o processo: os passos que seguiram, a experiência das várias pessoas envolvidas, as possibilidades de melhoria, etc. Com base nisso, podem procurar sistematizar o processo, já incorporando melhorias resultantes da reflexão realizada, para que possa ser realizado aquando da reforma de outros colegas.