Nancy White

Nancy White - fotoNancy White conta com uma larga experiência como facilitadora de Comunidades de Prática. Ela fala-nos aqui dessa experiência e oferece algumas dicas sobre como lidar com alguns dos problemas mais frequentes.

Comunidades de prática (CoPs): como as descreveria?

Bem, há imensas boas definições dadas pelos gurus. Assim, em vez de as definir, gostaria de partilhar como eu “sinto” uma CoP que realmente funciona bem. Sinto-me ligada, desafiada e apoiada, banhada por deliciosas oportunidades de aprendizagem e algumas vezes lutando com a minha identidade sobre o domínio da CoP.

Não estou certa se passamos muito tempo a reflectir sobre a experiência de uma CoP e como nos pode afectar. Defini-la é bom, mas senti-la… aí está a chave!

Viveu no Brasil durante algum tempo. O que fez?

Fui estudante Rotary em intercâmbio no Colégio Rio Branco em São Paulo no ano lectivo 1974-1975. Foi uma experiência que mudou a minha vida – além de que aprendi Português! Alguém quer dançar samba?

Pode descrever as suas responsabilidades como facilitadora?

Há várias camadas de responsabilidade. Na base estão os valores e a ética que possuo como facilitadora. A facilitação pode tornar-se uma forma de manipulação se não se tiver cuidado. Por isso, estar atento e respeitar esses valores é importante. Isso inclui valorizar todas as pessoas e não apenas aquelas com quem concordo. (sorriso)

A segunda camada de responsabilidade está em torno da preparação. Qual é o propósito do meu trabalho de facilitação? Quais são os objectivos do grupo e como posso ajudar a definir e facilitar os processos para os atingir? Esta responsabilidade de saber “em quê e para quê” se está a meter nalguma coisa é crítica.

A terceira camada é a facilitação propriamente dita. É da minha responsabilidade suportar os processos do grupo de forma ética e eficaz. Na maior parte dos casos, não é da minha responsabilidade ser um perito na matéria e até é importante manter esses papéis separados. Também não tem a ver com liderança. Mais uma vez, esse é um papel distinto.

Finalmente, a minha última responsabilidade relaciona-se com aprender com cada oportunidade de facilitação – aprender e melhorar. E o ciclo começa de novo.

Quais são os principais problemas que enfrenta enquanto facilitadora?

Gostaria de limitar essa questão ao ambiente em que mais opero actualmente – o ambiente virtual. A facilitação on-line oferece grandes e únicos desafios. Eis alguns:

  • comunicar de forma clara e explícita num ambiente sem pistas não verbais e linguagem corporal. Online, criamos o contexto para as palavras dos outros na nossa cabeça, o que faz com que quem escreve deva ter uma maior cuidado para ser claro. O desafio que se segue é o que se põe ao leitor – não assumir e colocar questões para clarificar as coisas. Isto demora mais tempo online, tanto para os membros do grupo como para o facilitador;
  • manter-se ligado e ajudar os outros a manterem-se ligados – é fácil ler rápido e passar à frente. É mais difícil mergulhar em maiores reflexões online. Não há o olhar de outras pessoas, as paredes de uma sala ou um limite de tempo. Assim, a atenção é uma comodidade mais preciosa online.

Pode falar-nos um pouco mais de uma comunidade de prática que facilite? Quem são os membros? Qual o domínio?

Facilito actualmente uma CoP de consultores internacionais que trabalham em questões de equipas multiculturais. Este grupo às vezes é uma equipa, mas a nossa relação também tem uma parte de CoP. É um pequeno grupo de 6-8 pessoas.

Também tenho uma CoP muito informal de facilitadores online. Operamos de forma ad hoc e nem todos se conhecem. A nossa principal forma de comunicação é o e-mail já que estamos espalhados pelo globo. Muitos dos membros são antigos alunos do meu curso de facilitação online. Trocamos informação através da lista de discussão onlinefacilitation@yahoogroups.com, mas a nossa actividade como CoP é através de e-mail.

Faço parte de uma CoP em CoPs – de que a Ana também faz parte, mas não me considero a facilitadora desta CoP embora às vezes assuma esse papel. Partilhamos as tarefas de facilitação (ou às vezes ignoramo-las).

Estas são apenas algumas. Nunca percebi bem a quantas pertencia até perceber o termo CoP. Mas tenho trabalhado nelas e com elas há anos. Ainda que nem sempre lhes tenha chamado esse nome!

Quais são os principais problemas dessa comunidade?

Penso que o maior desafio de todas as comunidades que mencionei é que são essencialmente distribuídas. Manter a energia e manter alguma coerência quando nunca ou raramente nos encontramos frente-a-frente pode ser um desafio.

Prefere comunidades virtuais ou presenciais? Porquê?

Oh, eu nunca diria que prefiro uma à outra porque as ferramentas online são uma forma de suportar comunidades. Elas não “criam” comunidades. Comunidade, para mim, não se define na base do local onde se “encontra” mas na qualidade das relações que constituem a comunidade. Tem a ver com pessoas, não com tecnologia ou localização.

É Americana mas facilita frequentemente comunidades noutros países e, consequentemente, com outras culturas? Quais os principais obstáculos?

Cada dia que passo apercebo-me de mais obstáculos, algumas vezes por tropeçar neles e cair. Aqui estão alguns obstáculos:

  • diferenças no acesso – pessoas com acesso lento e caro podem estar em desvantagem num grupo onde há outros com acesso rápido/barato. As pessoas usam os seus recursos de forma diferente e isso cria experiências diferentes;
  • linguagem – a Internet ainda é muito centrada no Inglês e os Americanos (sim, sou Americana) não possuem as mesmas características multilinguísticas de muitos dos seus parceiros de outros países, forçando mais interacção em Inglês. Há barreiras quando se tem de trabalhar numa segunda língua e podem criar diferenças e mais importante do que isso, aumentam a possibilidade de mal-entendidos – algo que já é muito fácil acontecer online;
  • valores culturais – este é um pouco mais difícil de generalizar porque os nossos comportamentos de interacção não são só influenciados pela nossa cultura, mas pela nossa idade, a nossa profissão, e as nossas experiências. Mas a lição é que não podemos assumir que porque uma determinada forma de fazer algo é confortável para nós também o será para os outros. Assim, há necessidade de verificar explicitamente as semelhanças e as diferenças e, se necessário, negociar normas. Este tipo de processo atrasa as coisas e muitas vezes as pessoas não querem investir esse tempo. Aprendi que não investir esse tempo pode revelar-se um erro muito caro;
  • fusos horários – algumas vezes é difícil realizar um evento síncrono online quando o grupo está espalhado pelos vários fusos horários. Há sempre alguém que tem de acordar a meio da noite. O truque é dividir a carga!

Como supera esses obstáculos?

Falei um pouco sobre técnicas para ultrapassar essas barreiras, mas penso que a mensagem subjacente é passar algum tempo a perceber o problema, lidar com ele e andar para a frente. Algumas vezes até perceber o problema está fora da zona de conforto de alguns, por isso isto é mesmo um desafio. Mas nós somos uma sociedade global – goste-se ou não – e por isso penso que temos de tentar, ainda que seja difícil e desconfortável.

Penso que também é importante notar que há GRANDES benefícios em grupos multiculturais. E às vezes também há benefícios na interacção online – onde podemos esquecer por um momento os estereótipos físicos e se relacionam em torno de palavras e ideias. Temos uma maravilhosa diversidade de ideias, culturas, experiências, e profissões. Por isso vale a pena!

Imagine que é membro de uma comunidade de prática. Pense num slogan para a promover.

Humm… Óptima questão. Mas difícil. (sorriso) Vamos aprender juntos? Coma chocolate e melhore em [nome do domínio]. A ligação que conta?

Quais são os seus objectivos profissionais (e pessoais) na vida?

Não sou uma daquelas pessoas que sempre soube o que “queria ser quando for grande”. Já tive várias profissões e espero ter mais. Assim, em vez de metas tenho um conjunto de “princípios operacionais”. Eles são:

  • aprender algo novo todos os dias;
  • trabalhar com pessoas inteligentes, interessantes, e positivas;
  • fazer pelo menos uma pequena diferença no mundo todos os dias;
  • divertir-me todos os dias e ESTAR nesse dia;
  • viajar de forma a nunca ficar demasiado fechada na minha forma de ver o mundo.

Pode sugerir dois livros?

Hahaha. Não. Tenho esta teoria sobre os livros. O mais importante é rodear-se de livros e estar preparada para os abrir a qualquer momento. Lá estará uma pérola à sua espera.

1 comment

  1. Ferdinand 29 Janeiro, 2011 at 20:44 Responder

    Logo de início nos deparamos com a pérola: “Isso inclui valorizar todas as pessoas e não apenas aquelas com quem concordo. (sorriso)” Não se encontra pessoas que pensam assim fácilmente.

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