José Cláudio C Terra

José Cláudio TerraJosé Cláudio Terra deixou de se dividir entre o Brasil e o Canadá e passou a dedicar a sua atenção ao mercado brasileiro. Aí criou a Terraforum. Tem alguns livros publicados e fala-nos de portais corporativos.

Muitas pessoas confundem intranets e portais corporativos. Rapidamente, como estabeleceria a diferença?

Esta é uma resposta que pode ser bem curta ou bem longa. A bem longa está no livro “Realizing the Promise of Corporate Portals” onde dedico um capítulo inteiro tentando explicar portais corporativos do ponto de vista tecnológico. Uma resposta relativamente curta, mas eficaz é dizer que o portal corporativo permite que as pessoas tenham acesso à informação correta e de forma personalizada as suas necessidades particulares, independente de sua origem, na hora em que precisam. De um ponto de vista mais técnico, a resposta curta é que uma Intranet pode afetar de maneira relativamente pequena a infra-estrutura de TI da empresa, enquanto um portal corporativo, além de oferecer um ambiente de publicação web como a Intranet, também afeta sobremaneira (e mesmo define) como as principais questões de TI de uma organização estarão evoluindo: estratégia de segurança, de ambiente de desenvolvimento, de integração de dados e aplicativos e mesmo de integração e colaboração com parceiros externos.

Entende os portais corporativos como uma evolução das intranets ou considera que a filosofia é tão diferente que têm de ser considerados individualmente?

Sem dúvida é uma evolução, mas representa um salto qualitativo enorme. A época das Intranets pode ser comparada à do Wild West, em que valia tudo e o importante era criar algo novo, fincar sua bandeira no chão. Com os portais corporativos chegamos ao momento da cidade organizada com regras bem definidas para o “comportamento digital” dos vários atores participantes da organização.

Portal é, provavelmente, um dos termos mais usados na web. Apesar disso, acreditamos haver muita confusão sobre o que, de fato, venha a ser um portal. Os “portais” populares como Yahoo, Lycos, UOL, AOL, começaram como um ponto de entrada para a web, que se expandia de forma desorganizada. Não demorou muito para estes portais perceberem que poderiam agregar os conteúdos mais relevantes e de qualidade dentro de seu “espaço”. Com isso, tornaram-se não apenas pontos de entrada da web, mas também destinos finais para uma grande variedade de serviços e informações.

Este conceito de acesso centralizado a informações e serviços migrou então para o universo corporativo. Esta migração, entretanto, não ocorreu, de novo, de forma organizada. A web se tornou um instrumento para diferentes departamentos, divisões e indivíduos publicarem conteúdos ou incluírem um serviço corporativo ou um aplicativo de e-commerce. As ferramentas disponíveis tornaram este processo algo muito simples e, em geral, gerido pelos conhecidos webmasters da empresa. Isto, no princípio, parecia um excelente negócio, mas no final das contas, as empresas passaram a contar com muitos sites, mas nenhum portal corporativo.

Isto ficou ainda mais evidente pelo fato das empresas não contarem apenas com informações criadas originariamente para o mundo web. As grandes empresas, em particular, têm investido milhões de reais em grandes sistemas de informação corporativos e acumulam milhares de outros tipos de documentos que são acumulados diariamente por seus funcionários, como planilhas de cálculo ou textos. Percebendo esta situação, algumas empresas começaram a criar, no final do “século passado”, o mercado de “portal servers”, servidores que permitem agregar, de forma personalizada, em um único ponto diversos tipos de aplicativos e fontes de informação que as pessoas utilizam no dia-a-dia. Estes servidores fornecem a plataforma necessária para se criar verdadeiros portais corporativos. Com verdadeiros portais corporativos, cada pessoa na empresa ou fora dela tem o seu portal particular.

Quais as vantagens de um portal corporativo?

Mais do que responder quais as vantagens, pois estas são inúmeras, eu diria que o mais importante é se entender que um portal corporativo representa uma evolução de toda a indústria de software. Praticamente todos os grandes “players” da indústria de software tem uma solução ou parte de uma solução de portais corporativos. Em termos muitos simples, representa uma volta à centralização, mas agora com personalização, combinando as vantagens dos dois mundos. A web facilitou muito a possibilidade de publicação descentralizada (são mais de 10 milhões de páginas sendo criadas por dia na web), mas também tornou muitas vezes impossível achar o que se quer. Nas organizações algo parecido também aconteceu não apenas pela web, intranets e extranets, mas também pelo enorme número de aplicativos não compatíveis que se desenvolveram ao longo dos anos 90 (ERP, CRM, PRM, eRH, etc, etc). Enfim, as empresas têm ao mesmo tempo, muito mais informação e pouco acesso à informação requerida no momento da ação e/ou decisão. Os portais corporativos oferecem soluções integradoras e de personalização para diminuir este efeitos do excesso de informação (information overload). Esta é a grande vantagem.

No livro, destaco com bem mais detalhes, vantagens específicas (redução de tráfego na rede da empresa, redução de custos de publicação e de desenvolvimento de interfaces web para aplicações back-end, distribuição e controle mais eficiente da informação, etc). Mas, de maneira geral, todas as áreas da empresa podem se beneficiar de um portal corporativo. TI é apenas a área que implementa e configura o portal. Todas as áreas da empresa, no entanto, podem participar de sua administração e utilização para gerar valor. Portais corporativos têm interfaces administrativas de uso extremamente amigáveis – basta em muitos casos saber usar um browser comum.

Implementar um portal corporativo não significa que ele venha a ser usado. Quais as principais razões para que não se registe a utilização desejada de um portal corporativo?

A principal razão para isso de maneira bem simples é quando o portal corporativo é desenhado sem levar em consideração as verdadeiras necessidades de informação, comunicação e colaboração dos vários grupos/segmentos de pessoas de uma organização. Na metodologia que emprego com meus clientes sempre começamos o projeto a partir da formulação de cenários de trabalhos (user tasks) antes e depois da implementação do portal corporativo. As outras razões é baixo desempenho técnico, velocidade lenta, problemas de integração, etc..

Qual o papel que um portal corporativo pode desempenhar num programa organizacional de gestão de conhecimento?

É fato que a Gestão do Conhecimento não depende do emprego de soluções de informática para que ocorra. De outro lado, a coisa muda de figura quando estamos falando em gerir conhecimento em grande escala. Uma coisa é aplicar práticas de Gestão do Conhecimento em uma área específica da empresa, outra coisa é aplicar a gestão do conhecimento envolvendo funcionários e não funcionários, diferentes escritórios, muitas vezes localizados em diferentes países, etc.. Neste último caso, portais corporativos são essenciais, pois eles permitem a empresa escolher diferentes estratégias em termos de centralização e descentralização da habilidade de publicar e acessar informações e pessoas.

Um portal corporativo pode ajudar à mudança cultural de um organização ou depende dessa mudança?

Do ponto de vista cultural os desafios são múltiplos. Antes de mais nada, a empresa precisa ter uma política de informação. Eu diria que 99% nem sabe o que é isso e não tem ninguém preocupado com isso de forma ativa e sistemática.

É evidente, também, que a implementação de portais corporativos implica numa maior democratização da informação e do conhecimento e isto como sabemos não é fácil, pois muitos ainda vêem a informação como fonte de poder. Com portais as informações contidas em vários bancos de dados e aplicativos passam a ficar amplamente disponíveis para um grande número de pessoas sem a necessidade de intervenção direta do pessoal de TI – mais uma mudança importante.

As pessoas têm também de se habituar a trabalhar de forma muito mais digital, personalizada e colaborativa. Para isto, no entanto, precisam investir um tempo inicial para adaptar suas ferramentas de trabalho. As pessoas e departamentos adquirem a possibilidade de publicar conteúdos de forma tão ampla quanto desejarem. Isto é uma grande mudança, pois antes dos portais corporativos as informações criadas individualmente eram compartilhados apenas através de e-mails ou em diretórios departamentais e os dados mais críticos estavam em aplicativos proprietários para os quais as pessoas encontravam muitas barreiras para acessar. Esta barreiras podiam ser técnicas, de configuração de máquina, de posse de senha, de treinamento para usar o software, etc..

Agora, é evidente que quando as pessoas começam a se beneficiar do uso do portal e compreendem como ele pode mudar o modelo organizacional e até mesmo de negócios de uma empresa, os portais corporativos podem exercer uma forte influência nos processos culturais de uma organização.

O seu livro “Realizing the promise of corporate portals” apresenta imensos casos de estudo. Qual o seu favorito? Porquê?

Um pai nunca diz que gosta mais de um filho do que de outro. No caso do livro, os casos também são assim. Eles precisam ser apreciados por suas contribuições específicas do ponto de vista de entendimento da inter-relação entre portais corporativos e gestão do conhecimento. Alguns casos são mais interessantes por causa da atuação da alta administração, outros pelas tecnologias e designs inovadores e outros ainda pelo uso eficaz da prática de comunidades virtuais. Enfim, estudos de casos são apenas a ponta do “iceberg”. Jamais tive a pretensão de contar toda a história de cada um dos casos, mas apenas de ressaltar pontos importantes em cada caso que possam ser usados pelos leitores em seus próprios projetos.

Em que estado se encontra o Brasil face à implementação e utilização de portais corporativos?

São pouquíssimas as empresas com programas estruturados amplos de Gestão do Conhecimento e/ou implementação de portais corporativos avançados. Dito isto, desde o ano passado o interesse cresceu muito. Na minha opinião, o ano passado foi o ano da descoberta (o que é?), este ano é o do como (Como justificar e implementar tais projetos?).

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