David Snowden

Controverso e irreverente, inspira quem o ouve e questiona os pressupostos. David Snowden encontrou a luz da ribalta ao lado de Stephen Denning pregando as maravilhas das narrativas. À frente do Cynefin Centre da IBM, Snowden explora agora a dinâmica dos sistemas complexos.

Como é que a análise de redes sociais pode ser usada para revelar padrões em ambientes complexos?

Esta é uma pergunta difícil porque a análise de redes sociais (ARS), enquanto expressão, é muito vasta. Uma abordagem consiste em colocar questões a indivíduos sobre se recorrem a outros indivíduos na rede para aceder ou entender informação, ou como mentores/conselheiros. Com uma grande ressalva, diria que este exercício pode ser de alguma utilidade. Porém, o seu problema de base, é que os dados recolhidos são altamente suspeitos (você diria que não confia no seu chefe?, ou que não recorre a ele em busca de ajuda?) e são interpretados fora de contexto. Sei, por experiência própria, que o contexto que tenho m mente quando respondo a esse tipo de questões influencia a minha resposta: alguém a quem recorro para me ajudar num contexto, não seria a minha escolha noutro contexto. De igual forma, há pessoas em quem confiaria numa crise, mas não no dia-a-dia. Quanto mais olhamos para qualquer técnica (e a ARS é apenas uma delas) baseada em questões estruturadas, mas duvidamos do valor dos resultados.

Uma outra abordagem procura monitorar ligações telefónicas, frequência de acesso ao correio electrónico, etc., etc.. Isto tem a vantagem de ser abrangente, mas depende de um grande volume de dados para garantir validade e levanta questões éticas. Isto significa, penso eu, que esta técnica apenas pode ser usada em circunstâncias excepcionais.

Nós já usámos ARS com sucesso como uma (entre outras – não ficámos dependentes dela) forma de perceber as interacções de organizações formais e informais. Aqui usámos um mecanismo de descoberta baseado em narrativas para revelar que comunidades existem e depois usámos o questionário em cada grupo. Isto parece ultrapassar muitos dos problemas da ARS entre indivíduos e, numa série de “filtros de perspectiva”, esta técnica parece permitir aos grupos interpretar de forma útil as interacções e os padrões da complexa interacção humana.

Uma nova área de investigação do Cynefin Centre é a ARS pervasive que depende de perguntas aleatórias no contexto de conversas, tanto em interacções individuais ou de comunidade. Pensamos, mas ainda não temos a certeza, que esta técnica será bastante útil quando procurarmos tendências ao longo do tempo, mas não tanto se procurarmos afirmações absolutas sobre a natureza das interacções num contexto específico.

Quais são os perigos de realizar exercícios de análise de redes sociais?

Muitos dos mesmos perigos que há em usar testes psicométricos (Myers Briggs, por exemplo): os resultados são frequentemente tidos como a verdade absoluta e/ou são usados para determinar intervenções partindo do princípio que oferecem prova empírica de vários comportamentos. Não estou certo de que esta utilização seja possível de evitar já que os resultados parecem demonstrar a “verdade”.

Usada como uma ferramenta para oferecer uma perspectiva, é útil. Usada por si só, ou sem precaução, é muito perigosa.

O processo pode também ser muito intrusivo e pode dar origem a questões éticas: pode ser difícil recusar uma resposta e a veracidade da resposta pode não ser a melhor aposta. Qualquer ferramenta sobre a qual isto pode ser dito deve ser usada com extremo cuidado.

Que outras técnicas e ferramentas se podem usar para identificar padrões existentes?

A melhor representação de padrões nas interacções humanas são histórias. A maioria do nosso trabalho envolvendo captura em massa e representação abstracta de narrativas é desenhado para permitir que os padrões venham ao de cima. Contudo, há duas qualificações importantes que a maioria das pessoas que trabalham com narrativas não percebem (tanto conceptualmente como na prática):

  1. o valor das histórias está no seu colectivo. Procurar significado em histórias isoladas e depois agregar resultados para extrair uma interpretação está errado (de todas as formas);
  2. os padrões nas histórias surgem da interacção de indivíduos e comunidades com as histórias. O utilizador do sistema é parte do padrão. Não se pode olhar o sistema de cima enquanto perito e extrair significado.

Este é um aspecto chave da complexidade: o significado emerge de interacções entre indivíduos (pessoas individualmente ou em colectivo) e ferramentas tais como narrativas (ou ARS, porque não?).

É também importante lembrar que os padrões são, por natureza, fluidos. Até certo ponto, não há o que se pode chamar de padrão existente, embora possamos usar padrões estáveis que surgem de múltiplas interacções.

Aqui tivemos enorme sucesso com o uso de arquétipos e temas como propriedades emergentes de grandes volumes de histórias. Estes são criados numa actividade de grupo e não são resultado da interpretação de um perito (aqui reside o seu valor). Os arquétipos em particular (frequentemente representados como cartoons) podem oferecer uma boa perspectiva sobre situações complexas já que oferecem os dados ao nível certo de abstracção para a mente humana. Ver um grupo de arquétipos cria uma nova perspectiva e entendimento sobre o comportamento do consumidor, do empregado e do mercado sem representações analíticas ou matemáticas. Esta é uma área em expansão do trabalho com narrativas e que pode produzir resultados rápidos quando comparada com outras técnicas analíticas mais tradicionais.

O que se pode fazer para ajudar uma situação a passar de caótica a complexa?

Muitas pessoas lidam com o caos através de um único ponto de atracção (attractor). Esta solução é rápida, muitas vezes eficiente, algumas vezes eficaz. O perigo é que a nova ordem seja dependente da entidade que a criou. Se essa entidade deixar de existir, ou começar a acreditar no seu mito de gradiosidade, o sistema pode regressar à desordem. Esta é a mudança do caos para o known e a técnica mais frequente de gestão de crises.

Passar do caos para a complexidade pode oferecer mais estabilidade e é conseguido através de vários pontos de atracção – várias intervenções muito fortes (algumas das quais podem ser pessoas) são realizadas para criar pontos de atracção em torno dos quais se podem formar novos padrões. Esta é uma mudança automática para um ambiente complexo. Depois podemos estabilizar os padrões de que gostamos (complexo para knowable) e destabilizar os outros.

Perceber a natureza de um ponto de atracção num espaço caótico e difícil, especialmente se não estamos habituados a salas de operação. Por isso geralmente recomendamos que as pessoas visitem o caos em circunstâncias controladas para desenvolver a capacidade de agir e sentir neste espaço.

Em que ambiente é mais provável ocorrer aprendizagem e geração de conhecimento?

Todos os ambientes possibilitam aprendizagem e geração de conhecimento. O seu contexto, a natureza da aprendizagem e do conhecimento variam de acordo com o sistema.

A inovação é mais provável em ambientes complexos ou caóticos do que em ambientes known ou knowable, mas nem sempre é assim.

Imagine-se daqui a cinco anos. Com que é que as organizações estarão preocupadas?

Essencialmente continuarão preocupadas com aquilo que as preocupa actualmente – fazer dinheiro (comerciais) ou dar resposta a maiores necessidades com menos recursos (governo). Há alguns aspectos que podemos antever – a geração do baby boom está a deixar as organizações e a levar o seu conhecimento consigo (uma das principais motivações para o uso de narrativas no governo).

O multiculturalismo irá (espero) tornar-se um problema há medida que as organizações perceberem que, numa multinacional, não podem impor a cultura da região onde a sua sede está localizada. Isto oferece à Europa grandes oportunidades.

Outras possibilidades (mas não previsões):

  • a água começa a ter o mesmo impacto que o petróleo em termos de escassez;
  • as tecnologias de comunicação mexem nos pratos da balança e passam de ferramenta de produtividade para tirania abusadora – recebemos tanto que deixa de ser útil;
  • as organizações percebem finalmente que as estruturas em matriz são uma perda de tempo e misturam hierarquia (as pessoas gostam de saber para quem trabalham) com coalescence (ligando grupos em alianças temporárias em torno de tarefas);
  • resulta do anterior que as organizações mais inovadoras tornar-se-ão pontos de atracção para muitos recursos que não têm mas que podem mobilizar;
  • percebemos finalmente que tentar derivar melhores práticas (best practices) a partir do estudo do que outras organizações fizeram é uma má ideia, usando práticas passadas em vez de abrir as portas a novas possibilidades;
  • as fronteiras das organizações tornam-se permeáveis;
  • o governo percebe finalmente que o seu papel é oferecer fronteiras e pontos de atracção que limitem e liberem as organizações comerciais, ao invés dos extremos ridículos de ordenamento de território e mercados livres.

O que podem as organizações fazer agora para se prepararem?

Quase tudo se relaciona com flexibilidade:

  • mudar de categorização para sense making – a utilidade de consultoria 2×2 está a chegar ao fim e as organizações necessitam ser capazes de definir os limites que lhes permitem fazer sentido dos dados que recebem, ao invés de “encaixar” esses dados a categorias já conhecidas;
  • deixar de tentar planear o futuro com base em objectivos e resultados mensuráveis, concentrar-se mais na criação de fronteiras que limitem a direcção futura e os padrões de gestão – estimulando, respondendo e destruindo;
  • tratar a gestão dos seus empregados mais como uma festa de adolescentes do que como a manutenção de uma máquina;
  • perceber que estar aberto a novas ideias não é uma parte da “missão” mas uma forma de trabalhar que será profundamente ameaçadora para aqueles no poder, e responder adequadamente;
  • aumentar o número de perspectivas que têm disponíveis;
  • envolver-se em programas do Cynefin Centre que se concentram em todos os aspectos atrás referidos!

3 comments

  1. Ferdinand 15 Janeiro, 2011 at 15:54 Responder

    Fiquei impressionado pela profundidade e novidade( para mim) dos temas/novas dimensões apresentadas pelo Snowden.

    Vamos já dar uma olhada na bibliografia e nos comentários de leitores da Amazon!

    A nota é no mínimo 6 dos 5 disponíveis da escala!

      • Ferdinand 17 Janeiro, 2011 at 12:09 Responder

        No site dele já estive e não vou perder de vista.

        Ele tem um livro publicado em 2005 em parceria com outros autores é o EMERGENCE: Complexity & Organization.

        Não vou comprar pois é caro e não é bem meu foco.

        Vou seguir teus conselhos e ler todos os artigos disponíveis.

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