Luis Suarez

Luis SuarezLuis Suarez tem um daqueles títulos que eu adoraria poder colocar no meu currículo. Ele é Knowledge Manager, Community Builder & Social Computing Evangelist no IBM Software Group. Tem uma larga experiência em gestão de conhecimento, tem uma invejosa rede de contactos e um blog de referência nesta área. Sigo-o no Twitter onde vou beneficiando das pérolas que vai partilhando e foi através do Twitter que o convidei para esta entrevista (não estivesse ele a tentar eliminar a sua utilização do email). As respostas que deu partilham a sua opinião sobre a gestão de conhecimento nas organizações, o papel das ferramentas sociais e as alternativas ao email.

Há muita teoria em volta da Gestão de Conhecimento Organizacional mas não há muito que seja partilhado sobre como é que isso se faz. Como é que a teoria da Gestão de Conhecimento está a ser traduzida nas organizações?

Durante alguns anos a abordagem escolhida para aplicar a teoria da Gestão de Conhecimento (GC) ao mundo dos negócios tem envolvido partes iguais de tecnologia (isto é, ferramentas) e processos, deixando de fora da equação, e negligenciando, as pessoas. Como consequência, acima de tudo, resultou num processo muito estruturado, focado, ultrapassado, demasiado ambicioso e complexo (por vezes) para tentar documentar o máximo possível do conhecimento explícito que os trabalhadores pudessem produzir. Apesar disso, provavelmente apenas 5% desse conhecimento foi documentado.

Hoje em dia, porém, essa abordagem está a mudar para um contexto muito mais acertado de actividades de partilha de conhecimento, onde a tecnologia e as ferramentas, em conjunto com os processos, estão a tentar encontrar o equilíbrio perfeito com as pessoas. E é aqui que a computação social entra em cena, porque nos últimos anos tem provado de que forma a combinação de trocas de conhecimento tácito e explícito são possíveis num ambiente de negócios, resultando numa aceleração da troca de conhecimento, e não apenas no enfoque oneroso de documentação do capital intelectual.

Afinal de contas, será a combinação de conhecimento e informação estruturados e bem documentados com actividades não estruturadas, semi-caóticas e fragmentadas de partilha de conhecimento que irão ajudar a moldar e definir a próxima geração da teoria de GC que, curiosamente, já era parte dos princípios de uma estratégia de GC bem sucedida há mais de treze anos atrás. Apesar disso, está agora finalmente a chegar e a ajudar toda a gente entender que as trocas de conhecimento tácito e explícito são actividades igualmente importantes para os colaboradores realizarem. Ao final de muito tempo, as pessoas são novamente parte da equação. E tudo isso graças ao software social.

Na sua perspectiva, quais são os principais desafios que as organizações enfrentam quando investem na gestão de conhecimento?

O maior desafio é provavelmente a carga trazida por anos passados quando a GC era usada como um conceito genérico que cobria quase tudo, resultando numa conotação e reputação cada vez mais negativas das quais estamos ainda a recuperar. As organizações que estão a pensar investir em GC devem finalmente aceitar o facto de que é muito difícil, se não impossível, gerir conhecimento, mesmo o conhecimento pessoal. Em vez disso, o que deveriam fazer para dar resposta a este desafio é ajudar os seus trabalhadores do conhecimento facilitando conversas que ocorram de forma natural, informal e não estruturada. E depois deixar que eles mesmos a estruturem da forma que melhor lhes parece. Ou mesmo que não a estruturem.

Basicamente, organizações a investir em GC devem perceber que não devem tentar controlar (de uma vez por toda); dar libertar aos seus trabalhadores do conhecimento para avançar, tanto dentro como fora da firewall da organização, e assumir responsabilidade pela forma como produzem e partilham pedaços de conhecimento com os seus colegas. A partilha de conhecimento é uma actividade muito pessoal e, como tal, a GC deveria abraçar o aspecto das pessoas, para ajudar a assegurar que esses trabalhadores do conhecimento controlam, eles mesmos, a forma como o conhecimento flui.

Finalmente, as empresas que investem em GC deveriam entender que tal como os processos e a tecnologia, as pessoas deveriam fazer parte da equação e deveriam abraçar métodos formais e informais para dotar os trabalhadores do conhecimento da capacidade de usar os sistemas tradicionais de GC bem como esta nova onda de ferramentas para partilha de conhecimento e colaboração que se encontram no espaço da computação social.

As organizações estão actualmente mais ou menos empenhadas na GC?

Se se pensar na GC em termos tradicionais de partilha e colaboração para produzir capital e bens intelectuais, eu pensaria que as organizações estão menos empenhadas. Como disse anterioremente, as conotações negativas por trás da GC ainda estão presentes, incluindo o facto bem conhecido de que é muito difícil gerir o conhecimento propriamente dito.

No entanto, se se pensar no crescente interesse das organizações em ajudar a passar a palavra em sites de software social, redes sociais e computação social, dentro e fora da firewall, o jogo muda de figura. Se se pensar na computação social como o aspecto das pessoas na equação da GC (ferramentas, processos e pessoas), então estou a pensar que poderemos estar a assistir a uma segunda chegada da GC. Provavelmente melhor identificada como Partilha de Conhecimento do que GC propriamente dita. A emergência destas ferramentas de software social está certamente a ajudar a trazer a GC de volta à luz da ribalta, mas desta vez com o equilíbrio certo: pessoas, processos e ferramentas!

Quais são os “elementos” da GC que mais podem ajudar as organizações durante o actual cenário económico?

Provavelmente alguns são os mesmos “elementos” que faziam parte da GC quando esta teve origem há mais de uma década atrás. A equação de que tenho falado de ferramentas, processos e pessoas vai seguramente ser chave. Porém, eu também pensaria que abertura, transparência, vontade de ajudar através da partilha e da colaboração, assumir responsabilidade pela forma como o conhecimento é partilhado pelos trabalhadores do conhecimento, são talvez outros elementos chave a ter em consideração. A maior parte destes vêm do mundo das redes sociais e, como tal, os princípios chave de alimentar relações pessoais de negócio, conectar com os seus colegas, estabelecer relações duradouras ao partilhar da mesma paixão num determinado tópico enquanto parte de comunidades são apenas alguns dos elementos fulcrais que vejo como de grande utilidade às organizações nos tempos que correm para nos ajudar a passar com sucesso de uma mentalidade assente no trabalho para uma baseada no conhecimento e na sua partilha (i.e. a Economia do Conhecimento).

Alguns consultores / autores sentem que as organizações precisam da cultura certa antes de poder começar um programa de GC. Outros defendem que um programa de GC pode ajudar a criar a cultura “certa”. Qual é a sua opinião?

Eu penso seguramente que a cultura certa tem de existir antes de se poder implementar um programa de GC. Veja, por exemplo, aquelas organizações onde o lema “Conhecimento é poder” é ainda muito importante. Seria difícil, ainda que não totalmente impossível, introduzir um programa de GC numa cultura organizacional onde o conhecimento é retido em vez de abertamente partilhado.

Trabalhadores do conhecimento sem vontade de partilhar o seu conhecimento com outros, aprender enquanto o fazem e colaborar com os seus colegas vão ter dificuldade em participar num programa de GC que eles consideram dispensável. Assim, como eu disse, penso que para um programa de GC ser bem sucedido seria melhor ter já alguma cultura de partilha.

Se tal não for o caso, não me interpretem mal, ainda é possível fazê-lo; apenas demorará muito mais tempo. Algo que no nosso mundo actual da Internet, onde a informação talvez flua mais rapidamente do que nunca, não seja algo que as organizações possam arriscar.

Como é viver e trabalhar num mundo sem email?

É maravilhoso! Estou a fazê-lo há mais de quinze meses e não me arrependo minimamente. É espantoso como é que algo que começou como uma experiência faz agora parte da minha vida profissional quotidiana e também da vida daquelas pessoas com quem colaboro e partilho conhecimento mais frequentemente.

Para mim os ganhos imediatos são óbvios. Ao longo destes quinze meses consegui reduzir 90% do número de emails recebidos semanalmente, o que significa que, em vez de passar duas ou três ou quatro horas por dia a processar emails, tenho esse tempo para “estar” em espaços de software social onde posso colaborar e partilhar conhecimento com as minhas várias redes sociais de uma forma aberta e transparente, de forma a que todos beneficiam. Não sou só eu.

E o facto de que o software social está a ganhar cada vez mais momento dentro e fora das firewalls organizacionais ajuda a que outros colegas entendam como se podem libertar do email e continuar a trabalhar em espaços sociais muito mais abertos e recompensantes.

E a ajuda na produtividade que obtemos ao ver a nossa caixa de correio electrónico consistentemente vazia faz com que tudo valha a pena. Ou quando vamos de férias, ou visitamos um cliente ou vamos a um curso e regressamos e vemos que não há emails para nos preocupar e que o trabalho continuou porque o resto da nossa rede social ajudou a realizar tarefas enquanto estivemos fora. E nessa altura é a minha vez de retribuir e ajudá-los a beneficiar dessas interacções tanto quanto eu beneficio. Uma óptima experiência! E que eu recomendo vivamente!

As organizações podem, realisticamente, aspirar a libertar os seus colaboradores das suas caixas de correio electrónico?

Sim, claro! E não é uma questão de como ou porque o fariam, mas mais de quando isso vai acontecer. Esta nova onda de ferramentas de partilha de conhecimento e colaboração na área de redes sociais está a ajudar os trabalhadores do conhecimento a perceber que todos podem ser igualmente produtivos, se não mais!, ao usar estas ferramentas em vez do email. De facto, eles são agora muito mais produtivos e estão expostos a mais informação, mais conteúdo, mais conexões (isto é, peritos) do que alguma vez tiveram, por isso têm uma oportunidade para encontrar, muito mais rapidamente, conteúdo e os peritos por trás dele.

Assim, com o software social como a maior alternativa para ajudar a reduzir o seu selva de emails, o maior desafio é a vontade de fazer isto acontecer. As ferramentas estão lá, o ambiente tem lá estado sempre, somos apenas nós que precisamos de meter uma nova mudança e perceber que nem todas as interacções têm de acontecer por email. Pelo contrário, podemos ajudar a diversificar isso de tal forma que apenas são enviados muito poucos emails.

Ao utilizar ferramentas como blogs, wikis, podcasts, social bookmarks, tags, microsharing services, etc. etc. temos oportunidade de finalmente domar a fera; uma que nunca pensámos poder domar, mas, eu consegui. Quinze meses sem usar email no trabalho e tão ou mais produtivo do que antes!

3 comments

  1. Victoriano Nazareth 3 Junho, 2009 at 11:24 Responder

    Esta agora!?…Nunca me tinha passado pela cabeça haver alguém que renunciasse ao e-mail. Mas é interessante ver como as redes sociais passaram a ter um papel importante na disseminação do conhecimento e se tornaram ferramentas eficazes na sua gestão.

  2. Ricardo Andorinho 8 Novembro, 2011 at 13:25 Responder

    Muito bom. Acompanho Luis Suarez há já uns anos e seguramente será uma das pessoas que entende na perfeição a simbiose muitas vezes complicada de explorar: A interferência entre a máquina e o homem.

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