Presidente do recentemente criado Instituto Intranet Portal no Brasil, Ricardo Saldanha tem dedicado os últimos anos ao estudo, à divulgação e ao apoio das intranets e portais corporativos. O site Intranet Portal que lançou em 2004, o Prémio Intranet Portal a que deu origem em 2008, são dois grandes contributos que o colocam no núcleo duro do mundo das intranets no Brasil.
Prémio Internet Portal. Que aventura foi essa?
Sem dúvida, sempre que criamos algo novo estamos diante de uma aventura – e isso é estimulante. No caso do Prêmio, porém, ele tinha um lastro de quatro anos: o site Intranet Portal, que fundamos em 2004. É perfeitamente legítimo vê-lo como mais um passo numa trajetória coerente, portanto.
Ele nasceu também da minha percepção, partilhada por muitos colegas, de que já há muita coisa boa sendo feita em termos de intranets e portais corporativos que agregam real valor às suas empresas. E de que faltava uma ação catalisadora, que também servisse para evidenciar boas práticas, gerando um ciclo virtuoso para esse mercado.
Depois do sucesso que o Prémio teve na sua primeira edição, em 2008, as expectativas eram grandes para a edição de 2009. O momento alto do Prémio só terá lugar no próximo mês com a cerimónia de entrega de troféus mas os vencedores já foram escolhidos. Como foi a edição deste ano relativamente ao número de casos inscritos e à qualidade dos casos apresentados?
A edição 2009 representa um grande salto em relação ao ano anterior, principalmente no que se refere ao porte da iniciativa. Em 2008, convidamos amigos do Senac-SP para o evento de encerramento e eles ficaram com uma ótima impressão, identificando também que o público que atraímos é potencialmente o mesmo de uma linha de cursos que eles desenvolvem, focados em Gestão do Conhecimento. Daí surgiu a oferta de co-realização, que muito nos honra, e o prêmio cresceu.
Isso se reflete no número de casos inscritos – 50% superior a 2008. Notamos também uma elevação da qualidade do conjunto de concorrentes: ano passado, havia claramente um grupo ainda imaturo demais, frente a outro grupo de casos avançados. Este ano, a tarefa dos jurados foi mais árdua, com disputas acirradas, já que os casos eram mais homogêneos. Considero esse dado muito importante e positivo, pois pode ser interpretado como uma métrica de que nossos objetivos maiores estão sendo alcançados.
Outra novidade é que passamos a premiar os três primeiros colocados em cada Categoria, além de dois Grand Prix, que levam o Troféu Senac-SP (honra que coube à Documentar, na área Privada, e à Embratel, no segmento Governo/Terceiro Setor). Ou seja: em 2008, distribuímos 4 troféus; agora, serão 11, ampliando o leque de boas referências para o mercado. A lista completa pode ser vista no site do prêmio.
O ano passado o júri decidiu não atribuir o troféu na categoria de Enterprise 2.0 por considerar que nenhum dos casos apresentados possuia a maturidade e consistência necessárias para merecer tal reconhecimento. Este ano, apesar de haver mais troféus a concurso, essa categoria foi retirada. A que se deveu essa decisão?
Há dois motivos principais. O primeiro é que o prêmio está baseado na visão “Portal, Content & Collaboration”, apresentada pelo Gartner em 2006, mostrando que essas três coisas devem ser tratadas de forma indissociada se quisermos ter ambientes digitais realmente avançados. Enterprise 2.0, portanto, não aparece explicitamente nesse modelo – na verdade, ela é o que melhor representa a sinergia dos três pilares. Como o Grand Prix do prêmio representa justamente essa busca pelos casos mais completos e bem articulados, vimos que não fazia sentido segregar Enterprise 2.0 numa categoria – ela representa, na verdade, a meta maior para todo o ambiente.
O segundo ponto é que o prêmio faz uma análise técnica e outra de resultados. Na visão funcional, ficava difícil classificar os itens reconhecidos como web 2.0 quando você tem também categorias de Contéúdo e Colaboração, principalmente. Ou seja: mais uma vez, o fato de Enterprise 2.0 representar uma mescla dos três pilares gerou problemas no momento de se avaliar o quesito de forma isolada.
Portanto, não significa que não estejamos mais avaliando o quanto os ambientes avançam rumo à Enterprise 2.0 – na verdade, é justo o contrário, já que entendemos que colocá-la como uma categoria era rebaixá-la para um nível inadequado. Os quesitos técnicos do ano passado referentes à Enterprise 2.0 continuam na lista de avaliação dos jurados, mas agora distribuídos nos três pilares que foram mantidos.
Os benefícios da integração de ferramentas sociais nas intranets e portais corporativos são largamente aclamados (veja-se, por exemplo, o caso da Intel recentemente publicado no KMOL). Sente que as organizações brasileiras com intranets “tradicionais” estão a fazer esforços no sentido de integrar essas ferramentas mais colaborativas e de maior interacção?
Vemos uma relação direta entre a estrutura e a cultura organizacionais e as intranets que são criadas – afinal, elas são ferramentas, moldadas à luz de algo maior, que é a empresa e seus objetivos de negócio. Se pensarmos que o ambiente corporativo, de uma maneira geral, é conservador (principalmente se comparado à internet), fica mais fácil entender porque as empresas caminham mais lentamente em direção à adoção de ferramentas colaborativas.
Isso é reforçado pelos próprios resultados do prêmio: as notas somadas de Colaboração são sempre mais baixas do que as de Integração em TI que, por sua vez, são mais baixas do que as atribuídas ao quesito Conteúdo. Colaboração é a última fronteira, a mais recente, e mexe com a lógica hierárquica das corporações – logo, há tanto resistências em função de ser algo pouco compreendido quanto pelas ameaças que possam representar ao status quo.
A boa notícia é que o dinamismo do mundo atual e a inexorável necessidade de gestão da informação e do conhecimento para manutenção da competitividade estão criando uma tensão positiva em favor dos ambientes colaborativos. Veremos rápidos avanços em curto espaço de tempo.
Uma novidade do Prémio este ano foi a atribuição de dois Grand Prix: um para organizações públicas e outro para empresas privadas. Observaram diferenças significativas entre os casos apresentados pelos sectores público e privado?
Antes de mais nada, é importante que se diga que essa decisão não está relacionada à qualidade dos casos. Pode haver prova maior do que o trabalho desenvolvido pela ENSP, vencedora em 2008, superando empresas privadas poderosas, como Banco Itaú e Oi (do setor de telecomunicações)?
Entretanto, a ideia de que “empresas privadas são sempre mais avançadas do que as organizações públicas”, embora falaciosa, faz parte do nosso senso comum, infelizmente. Com isso, notamos que as organizações públicas tinham receio em inscrever seus casos, achando que jamais ganhariam, o que representava uma enorme perda para o prêmio e para o mercado (e mais ainda para os órgãos públicos).
Outra motivação foi a constatação de que projetos nas empresas privadas normalmente se baseiam em equipe enxuta, software proprietário e terceirização. Já nas organizações públicas, a diretriz para o software livre é muito forte, as limitações para contratar consultoria externa são maiores e isso leva a uma tendência de desenvolvimento interno. São fatores que, tecnicamente, contribuíram para a decisão por dois Grand Prix.
Sei que está sempre atento à avaliação de intranets noutros países. Como, no seu entender, se comparam as intranets brasileiras com essas além fronteiras?
Esse é um mercado tão recente e que nasceu justamente num momento de globalização que notamos muito pouca diferença dos casos de ponta aqui e lá de fora. Por outro lado, tenho a sensação de que há menos casos de primeira geração lá fora, enquanto no Brasil ainda há um grupo grande de intranets imaturas – mais um motivo para termos criado o prêmio, visto que elas podem se beneficiar dos avanços das demais.
Veja, por exemplo, os resultados da pesquisa “Global Intranet Survey”, organizada pela Jane McConnell (cujos resultados, em primeira mão, serão apresentados no evento de premiação deste ano). As barreiras e as fragilidades apontadas ali são as mesmas que acontecem aqui, uma vez que boa parte delas têm como pano de fundo a lógica industrial e hierarquizada, que não é privilégio de nenhum país em particular.
Para além do reconhecimento dos bons casos, o Prémio é ainda um instrumento de motivação e aprendizagem para todas as organizações que pretendem recorrer às intranets e portais corporativos no apoio à gestão de conhecimento. Quão bem sucedido está a ser o Prémio quanto a este último objectivo?
Você tem toda razão: o prêmio nunca foi concebido como uma ação de mera distribuição de troféus, ainda que o reconhecimento de quem está fazendo acontecer seja também uma meta importante. Isso se revela em várias decisões e ações práticas, como a opção por ter diversos critérios de avaliação, todos validados por um board de profissionais da academia e do mercado. A edição do livro coletânea e o próprio evento também demonstram isso, sem falar que todos os concorrentes, vencedores ou não, recebem um relatório de feedback dos jurados.
Embora a expressão “gestão do conhecimento” esteja um tanto desgastada, é fato que os portais avançados são os melhores suportes tecnológicos para a construção da inteligência coletiva e para fomento da inovação. Isso está muito presente na visão que baseia o prêmio: conteúdo e colaboração são os dois aspectos do processo de aprendizado, suportados pela tecnologia.
A edição do livro coletânea e o próprio evento de encerramento, que acontecerá nos dias 12 e 13 de novembro, também demonstram isso, sem falar que todos os
concorrentes, vencedores ou não, recebem um relatório de feedback dos jurados.
O Prémio tornou-se a primeira iniciativa do recém-criado Instituto Intranet Portal. Quer falar-nos um pouco deste Instituto e do papel que pretende representar no cenário organizacional brasileiro?
O Instituto nasceu da edição 2008 do prêmio – e assumiu a sua organização a partir deste ano. A ação catalisadora do prêmio não se limitou à reunião de casos: congregou todos os atores desse segmento, viabilizando a ideia do Instituto Intranet Portal, fundado em março.
Ele funciona como um hub, se posicionando como “centro” do mercado. É por isso que buscamos associados entre os profissionais (pessoas físicas), os fornecedores e as empresas clientes, que mantém suas intranets e portais.
O Instituto é, portanto, uma associação sem fins lucrativos que tem como missão fomentar e profissionalizar este mercado. Queremos ser um Centro de Referência e de Apoio Estratégico para acelerar esse processo.
Nosso objetivo maior é a evolução do segmento. E também queremos obter maior conhecimento, reconhecimento e credibilidade para os profissionais que atuam no setor.
Quais são os grandes desafios que se antevêem para o Instituto? E quais são as grandes oportunidades?
Pensando no Instituto em si, o grande desafio é nos posicionarmos corretamente – de forma indepente, plural e isenta – e sermos percebidos como algo relevante. Somente com muito trabalho e dedicação chegaremos lá.
Já pensando no nosso objeto – as intranets e portais corporativos – um dos principais desafios é mostrar o quanto podem fazer a diferença num mundo dominado pela economia do conhecimento. E, assim, caracterizá-las como instrumentos de competitividade – e não como meras ferramentas de TI.
Outro desafio é, efetiva e diretamente, elevar o nível de maturidade do mercado, seja trazendo informações de ponta, estimulando o benchmarking e a troca de conhecimentos ou gerando métodos e artefatos que suportem os projetos e as iniciativas.
As oportunidades são muitas, já que estamos no “olho do furacão” quando se trata de pensar como as novas tecnologias podem se inserir no mundo dos negócios e do trabalho.
Prémio Intranet Portal 2012. Que tipo de candidatos iremos encontrar? E o que diferenciará os vencedores dessa edição do Prémio?
Eu creio que vamos ver disputas cada vez mais acirradas. E soluções cada vez mais inventivas, fugindo do lugar comum. Haverá um reflexo na melhora das notas de Colaboração, associadas também a uma melhor compreensão de como ela pode e deve ser articulada com Conteúdo e Integração para produzir resultados efetivamente superiores.
Espero também ver uma amplitude maior de indústrias utilizando intranets e portais de forma avançada – o que também servirá para demonstrar, pela diversidade, o poder dessas ferramentas.
A principal diferença para os casos de hoje será que os vencedores estarão criando seus portais mais preocupados com o negócio do que com as funcionalidades. Haverá uma compreensão maior deles como tecnologias aplicadas.
Por outro lado, a tecnologia em si vai avançar, oferecendo uma experiência para o usuário mais suave. E recursos de gestão e modelagem que tornem a vida dos gestores mais simples. Nesse sentido, veremos uma explosão também do uso efetivo de multimídia nestes ambientes, na medida em que comprovem cada vez mais seu valor e que as condições de infraestrutura se ampliem, com a banda larga.
É por esse cenário que trabalhamos – espero que possamos reler essa entrevista em 2012 com a sensação do dever cumprido.
Nota: Os leitores do KMOL têm 20% de desconto no evento de encerramento do Prémio Intranet Portal 2009. Basta, para isso, que escreva “KMOL” no campo “Código Promocional” do formulário de inscrição.
Ana,
Referenciei as duas entrevistas (essa e a da Juliana Marques) em meu blog, ok? Em respeito ao trabalho que você deve ter tido na condução das entrevistas, evitei reproduzir os trechos. A ideia é que os interessados nos assuntos venham a seu blog, que é fonte rica de conteúdo sobre GC.
O link foi publicado em: http://www.conhecimentoeti.com/2009/10/entrevistas-intranets-e-portais.html
Abraços,
Rafael Ramos
http://www.conhecimentoeti.com
Muito obrigada pelos links, Rafael, e também pelo respeito demonstrado 🙂
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