Raphaël Briner é o Diretor de Marketing na Knowledge Plaza. É o autor do Canvas de Partilha de Conhecimento (Knowledge Sharing Canvas – KSC), um interessante instrumento de trabalho que ajuda a pensar nos fluxos de conhecimento com o objetivo de aumentar o acesso ao conhecimento coletivo.
Li um artigo seu. Nele descrevia o Canvas da Partilha de Conhecimento como “uma mala de ferramentas acessível, eficiente e participativa para que os entusiastas do conhecimento sejam bem sucedidos na análise, desenho, desenvolvimento, implementação e avaliação de uma Rede de Partilha de Conhecimento”. O que é para si uma Rede de Partilha de Conhecimento?
As Redes de Partilha de Conhecimento são muito inclusivas. Até uma conferência é uma rede de partilha de conhecimento. A conferência oferece contextos e desafios explícitos. Os oradores trazem histórias para demonstrar as suas reflexões e os participantes usam o Twitter como canal para enviar sinais positivos e negativos. O Canvas de Partilha de Conhecimento (Knowledge Sharing Canvas – KSC) foi desenhado para funcionar com o mundo físico, num desafio de mapear o que constitui o conhecimento coletivo.

O Knowledge Sharing Canvas (clique na imagem para aumentar e clique aqui para fazer o download do booklet criado por Raphael e a sua equipa)
O Facebook é, sem sombra de dúvidas, uma das maiores redes de partilha de conhecimento. Os contextos, essencialmente os temas do dia, vão mudando de acordo com as notícias mundiais e os momentos pessoais dos seus utilizadores. A maior parte das pessoas entende que as histórias pessoais têm muito mais alcance do que simples links no “top feed”. As histórias dão contexto à informação e envolvem as pessoas mais do que os “gostos”. Ajudam as pessoas a entender a motivação e a sua relevância. Claro que uma fotografia é uma bela história!
Na nossa vida pessoal, escolhemos o Facebook em vez de outras redes porque sabemos ter uma maior audiência. O sucesso dos “gostos” reside no poder que têm enquanto sinal explícito de atenção conquistada.
Todas as empresas têm uma atividade de partilha de conhecimento. Este tipo de atividade de partilha é apenas mais complexo e distribuído do que aquele que resulta das conferências. Quanto mais explícito for este processo, mais fácil será ultrapassar os seus concorrentes na conquista de clientes, na inovação e nas operações. Não tenho qualquer dúvida que a Amazon, a Tesla, o Airbnb e todas as fantásticas start-ups por esse mundo fora estão a construir rapidamente um forte capital intelectual, mesmo que partilhado publicamente.
Nesta busca pela relevância e melhoria da experiência do colaborador e/ou cliente, existe um grande interesse em organizar reuniões com colegas e parceiros para determinar como a empresa é capaz de promover uma cultura de conhecimento (não apenas de inovação): definir aspectos como o âmbito, os papéis, as ferramentas, as ideias, as motivações e os problemas.
Esse é exatamente o propósito do KSC: ser usado para estruturar conversas e facilitar o entendimento comum de uma situação global. Ajudará a definir:
- os Desafios existentes (silos, demasiada informação, etc)
- a forma como os utilizadores identificam Contextos (p.ex. etiquetas, grupos, projetos)
- as várias Experiências de utilizador (p.ex. interfaces móveis, newsletters)
- os Resultados desejados (p.ex. o desempenho e a excelência)
- os Ofertantes (Givers) que, quando são os mesmos que os Recetores (Takers), mostram um sinal muito bom de inclusividade
- os Bens de conhecimento disponíveis (p.ex. bases de dados documentais)
- o tipo de Histórias (p.ex. atualizações de estado, minutas de reuniões, incidentes, reflexões pessoais)
- a quantidade e o tipo de Feedback (p.ex. comentários, “gostos”, validação).
Acredita que é possível criar redes de partilha de conhecimento? Ou devemos apenas procurar identificá-las e ajudar ao seu desenvolvimento?
Depende do propósito e da energia das pessoas responsáveis (Euan Semple, 2014). Mudar bens, diretórios, bases de dados, não é um problema. Mudar pessoas também não, desde que a nova experiência seja excitante e promissora. O mesmo acontece na vida real.
Por exemplo, o Web Summit está a mudar-se de Dublin para Lisboa. Novos oradores, novos desafios, novos tópicos e uma nova rede. E, acima de tudo, uma nova experiência. O meu amigo Laurent Haug, fundador da Lift Conference confidenciou-me que a coisa mais difícil é manter a rede fresca e cheia de energia ao longo dos anos.
A qualidade versus a quantidade é um desafio universal, sempre dependente dos recursos humanos possíveis e, mais recentemente, de algoritmos e automatização disponíveis.
O Web Summit fez um fantástico trabalho com uma newsletter, que incluía mensagens personalizadas. Passaram de 1000 participantes para 30000 pessoas, muito entusiasmadas com a ideia de ir a Lisboa! Um esforço brilhante apoiado numa promessa bastante simples: “Eles vão lá estar. E você?”
Relativamente ao tópico dos algoritmos e da automação, pergunto-me por vezes se o Watson da IBM ou o Microsoft Delve terão um impacto significativo na partilha de conhecimento. Olhando para os blocos do KSC concluo que a computação cognitiva nos vai ajudar a classificar e a capturar conhecimento, mas nunca poderá substituir o ser humano no processo de partilha.
A magia reside nas pessoas e nas suas histórias: nos sentimentos, nas intuições, em conjunto com os dados, as experiências, os factores transformativos independentes dos sistemas internos, e o conhecimento complementar oferecido pelo coletivo.
A falha de um único sistema (Stowe Boyd, 2015) e as múltiplas redes profissionais têm um grande impacto no fluxo de informação e na captura de conhecimento, atrasando a futura penetração da computação cognitiva.
Acredito que a partilha de conhecimento seja o primeiro vetor de mudança, e que constitui um bom equilíbrio de histórias semanais, interações um-a-um, check-in e check-out, descobertas quotidianas e reuniões mensais de design thinking.
O KSC considera Relações e Atenção como o último nível. O que torna estes dois elementos tão importantes?
A forma como conseguimos equilibrar estes dois elementos irá definir o sucesso do nosso projeto. Se pedimos às pessoas para criar demasiadas Relações em torno do conteúdo, por exemplo exigindo 20 etiquetas por documento, vamos reduzir o envolvimento das pessoas pois estamos a gerar demasiada fricção no processo contributivo. Por outro lado, se pedirmos demasiada Atenção, com o envio de uma newsletter diária por exemplo, iremos criar demasiado ruído e, consequentemente, reduzir o envolvimento. Esta é claramente uma questão de governança e gestão de notificações.
O sucesso de adoção de redes sociais corporativas depende de uma simples premissa implícita: através delas vai poder conquistar a Atenção generalizada de toda a empresa, algo impossível de conseguir com um clássico sistema de gestão de conteúdo (Lee Bryant, 2015) ou intranet, sem sistemas inteligentes de notificação, sem recompensas pessoais, sem feedback ou conversas.
Há ainda muito a fazer, e não falo sequer de questões culturais, fora da missão do KSC: atitudes, mentalidades e outras noções que resultam de novas tendências como a holocracia, a teoria U, a lean enterprise, a cultura can-do, etc.
Como e quando pensa que as pessoas irão usar o KSC?
Desde o primeiro dia que quis criar uma ferramenta universal: daí ter deixado de lado o ecossistema Knowledge Plaza. Criei o KSC a pensar em qualquer entidade que queira ter uma ferramenta para a ajuda a pensar:
- nos principais componentes de uma rede de conhecimento
- no que vai bem
- no que pode ser melhorado
- nos travões e nas motivações.
Qualquer líder pode utilizar o Canvas para si mesmo, para uma sessão de trabalho, para um estudo de caso. Todos nós temos uma rede mais ou menos ativa de partilha de conhecimento.
Criou o KSC no contexto do trabalho que faz na Knowledge Plaza, uma plataforma para partilha de conhecimento. Porque considerou ser importante a criação de uma ferramenta como esta?
Há cerca de quatro meses, numa sessão de trabalho no Impact Hub Geneva, pediram-me que apresentasse o Canvas a dois diretores da WWF, que ali trabalham todas as sextas-feiras para estarem mais perto dos inovadores. Estavam a lançar um projeto disruptivo. Em 30 minutos, encheram o KSC com as suas reflexões e entenderam até que ponto o conhecimento os poderia ajudar a conseguir mais projetos, mais recursos, e a conseguir mais apoio do resto da WWF. Não acredito que tivesse sido possível conseguir criar essa consciência sem o KSC. O KSC ajudou-os a perceber, por eles próprios, todos aqueles pontos! Pensamento estratégico e facilitação em torno de um modelo conceptual, são a melhor forma de começar e lidar com qualquer projeto.
Eu não tinha um objetivo claro quando comecei a desenhar o KSC. Tinha apenas uma inspiração muito clara que foi prontamente apoiada pelos meus colegas.
Depois de meses de reflexão, testes com gestores, mais de 20 sessões de trabalho em 10 cidades europeias, sinto que o KSC está suficientemente robusto para se aguentar muito tempo. Contudo, demorará anos até entendermos o seu impacto na gestão de conhecimento, na gestão de recursos humanos, na estratégia, na colaboração e na comunicação interna.
Porque sentiu a necessidade de criar um instrumento de caneta e papel para orientar a reflexão em torno de algo que é cada vez mais de natureza digital?
Quem disse que só devemos trabalhar digitalmente? Eu observo e conduzo sessões de trabalho que visam ajudar as pessoas a aceder a uma maior capacidade coletiva, encontrando pontos comuns entre os seus valores e melhorando os fluxos de inteligência coletiva. A caneta e o papel são a força motriz dessas sessões de trabalho. Se queremos chegar aos decisores e agentes de mudança, o KSC parece ser o mapa conceptual apropriado para mobilizar as várias energias na empresa. As pessoas irão descobrir a importância das histórias e do feedback no processo de partilha, que não pode ser confundido com o processo de gestão. O KSC faz as pessoas pensar.
Sempre que conduzo uma sessão de trabalho, descubro uma nova abordagem e forma de pensar apontada por um participante. Espero que as pessoas utilizem o KSC para orientar as suas reuniões, para que qualquer gestor de projeto fique mais consciente da partilha de conhecimento como um acelerante, para aumentar a dimensão do ecossistema, etc.. Como a minha colega Nora Ghitescu diz, através do KSC partilhamos um padrão mental de pensamento que nos permite mapear visualmente respostas complexas e perceber o processo natural da partilha de conhecimento.
Pode partilhar algum momento de revelação – um daqueles momentos “ahah” – que tenha ocorrido graças à utilização do KSC?
No mais recente encontro de utilizadores Knowledge Plaza, convidei um grupo de 25 clientes a mapear o que estão a fazer bem nas suas redes, o que poderia ser melhorado, os desafios que enfrentam. Em 10 minutos reunimos mais de 100 post-its. Graças às anotações formalizadas, consegui organizá-los de maneira muito estruturada. Considero que são respostas bastante estratégicas e irei usá-las este ano quando continuarmos a trabalhar nas nossas ferramentas, no nosso produto e no nosso website.
Tive a sorte de entrevistar um cliente nosso, de uma agência de publicidade com sede em Manchester, a propósito da sua utilização da nossa plataforma. Utilizei o KSC para orientar a entrevista. O Canvas ajudou-o a responder e eu fiquei com uma melhor compreensão do caso de negócio, e, acima de tudo, do “porquê” e do “quem”.
Assumo que encoraje os seus clientes a usar o KSC para melhor definir a estrutura da sua plataforma Knowledge Plaza. Podemos dar alguns exemplos de como as respostas no KSC influenciam a configuração da Knowledge Plaza?
O KSC ainda é relativamente novo. Estamos atualmente a introduzir esta metodologia no nosso programa de Customer Success. O KSC faz agora parte do dia de acolhimento na KP Academy. Encaixou lindamente!
Depois de muitas sessões de trabalho, percebi que a melhor forma de trabalhar o KSC era projetando-o numa grande parede branca e usando post-its para o ir preenchendo. Dessa forma, todos os participantes podem participar, adicionando as suas ideias e lendo os demais contributos. Ajuda a criar uma visão global dos principais blocos da rede.
O facto de ser participativo e analógico, torna-o muito agradável para os participantes.