The Knowledge Management Fieldbook

The Knowledge Management Fieldbook - capa“Este é o único livro que lhe oferece as ferramentas e técnicas para implementar, gerir e explorar um sistema de gestão de conhecimento dentro da sua organização.” Estas são as palavras que, na capa do livro, nos aliciam para a sua compra. Foram elas que me convenceram.

Talhado para pessoas que já perceberam a importância da gestão de conhecimento e que querem agir, este livro apresenta, na introdução, uma definição de gestão de conhecimento: “o processo pelo qual a organização gera riqueza a partir dos seus bens intelectuais ou baseados no conhecimento” (“the process by which the organization generates wealth from its intellectual or knowledge-based assets”). A forma como, daí para diante vão usar aleatoriamente os termos informação e conhecimento, e aquilo que entendem por “bem intelectual” são também apresentadas neste capítulo.

As razões apontadas para a actual necessidade de gestão de conhecimento são a grande quantidade de informação trazida pelas novas tecnologias, e a redução do número de gestores intermédios. Na verdade, recorrendo um pouco às ideias de Nonaka e Takeuchi, as autoras afirmam que ao eliminarem os gestores intermédios, as organizações eliminaram, simultaneamente, as pessoas capazes de ligar as questões práticas às estratégicas, e de estabelecer pontes entre as diversas estruturas verticais das organizações. Esta ponte encontra agora os seus alicerces na gestão de conhecimento.

O segundo capítulo oferece uma das ferramentas mais valiosas deste livro: um diagnóstico da gestão de conhecimento. Este, conduz o leitor através de um conjunto de frases que caracterizam melhor ou pior a sua organização. O leitor terá, então, de fazer essa avaliação, calculando, no final, os resultados de acordo com a simples fórmula oferecida. As frases estão organizadas em sete módulos, sendo que cada módulo corresponde a um capítulo do livro. A ideia é não só permitir uma reflexão cuidada sobre o actual estado da organização em termos de gestão de conhecimento, como indicar ao leitor mais ocupado as secções sobre que se deverá debruçar.

No primeiro capítulo as autoras apresentam a estrutura do processo de gestão de conhecimento (Knowledge Management Process Framework). Nela definem-se duas correntes distintas: a táctica e a estratégica. A táctica apresenta quatro fases, dispostas num contínuo – obter, usar, aprender e contribuir (get, use, learn, contribute) – enquanto que a estratégica aponta três – avaliar, construir/manter e dispensar (assess, build/sustain, divest).

Os capítulos que se seguem reflectem, cada um deles, sobre cada uma destas fases. A estrutura usada é a mesma para todos: uma visão esquemática do capítulo, uma introdução onde as autoras justificam a importância/existência da fase em consideração, os imperativos e os desafios a ter em conta e que são cuidadosamente descritos, justificados, e ilustrados com casos de estudo de algumas empresas, e, uma agenda de trabalho.

A agenda de trabalho consiste num conjunto de acções que as autoras sugerem e que estão directamente ligadas com todos os aspectos focados no capítulo. Para que o leitor possa aferir da sua necessidade de considerar cada uma das sugestões, após a apresentação dos desafios, o livro propõe-lhe um pequeno exercício de reflexão. Este convida à avaliação da importância de cada desafio e da capacidade da organização em lhe dar resposta.

No terceiro capítulo, dedicado à fase táctica “obter”, as autoras apontam os seguintes imperativos:

  • articulação – as pessoas são capazes de descrever a informação de que precisam;
  • consciência – as pessoas sabem onde procurar informação;
  • acesso – as pessoas têm ferramentas para encontrar e capturar informação;
  • acompanhamento – novas funções organizativas suportam os utilizadores de informação; e,
  • completude – a informação é compreensível e bem estruturada.

Do desenvolvimento de cada um destes pontos, devo frisar as seguintes ideias:

  • procura activa em oposição à procura passiva (que em termos de tecnologia se traduz em tecnologia pull e push, respectivamente);
  • as vantagens e desvantagens de iniciativas que começam em camadas inferiores e vão escalando a hierarquia organizativa (bottom-up);
  • o novo papel e a crescente importância do bibliotecário; e,
  • as diferenças entre o gestor de conhecimento e o coordenador de conhecimento (no sexto capítulo as autoras introduzem ainda o papel do mordomo de conhecimento).

Os casos de estudo apresentados nesta fase incluem McKinsey & Company (Rapid Response Network), Chevron (Best Practices Resource Map, Knowledge Connection), Teltech, Ford Motor Company (InfoNet, Web Farm, Enterprise Knowledge Base), Heller Financial, Dow Jones Interactive Publishing, e ICL (Café VIC).

A fase táctica “usar”, abordada no quarto capítulo, requer:

  • permeabilidade – as ideias circulam dentro e fora, de dentro para fora e vice-versa; e,
  • liberdade – as pessoas sentem-se confortáveis para agir segundo as suas ideias.

Directamente relacionada com a circulação de ideias, está a estrutura da organização. Por essa razão as autoras falam das vantagens de uma estrutura hierárquica e de uma orientada para processos. A sua ideia, contudo, é que as organizações necessitam de se adaptar a “diferentes estruturas em simultâneo por forma a conseguir (…) fazer um uso criativo do conhecimento”.

Ainda relacionada com a permeabilidade está a organização do espaço físico de um escritório. Este aspecto, raramente referido, é aqui cuidadosamente debatido.

As autoras referem ainda neste capítulo os três tipos de disfunções de acessibilidade (abordagens de cima para baixo, atravessando a organização na horizontal, e de baixo para cima) e a importância da transparência.

Finalmente, este capítulo sugere a criação de espaços de experimentação, e aponta algumas possíveis técnicas para acordar o potencial criativo da organização: analogias, reuniões sem agenda, mindmapping e mindscaping (ao qual é dedicado um espaço com a identificação dos seus pontos fortes), reuniões informais, narrativas, e simulações.

Os casos de estudo apresentados são Oticon (“des-organização”), Alcoa (desenho do escritório baseado nos processos organizativos), Fairchild Semiconductor, EBC (parceria com empresas concorrentes), e 3M.

A aprendizagem dá o mote ao capítulo seguinte. Aqui são discutidos os dois imperativos desta fase:

  • visibilidade – a ligação entre a estratégia e a aprendizagem derivada das tarefas quotidianas deve ser clara; e,
  • habituação – a aprendizagem é uma actividade natural.

Os desafios que se colocam no segundo imperativo são interessantes:

  • promover o prazer no (e pelo) trabalho;
  • incluir mecanismos de reflexão na rotina do trabalho;
  • capturar as vantagens que advêm de erros, falhas e desentendimentos; e,
  • fomentar a aprendizagem pela acção.

Os exemplos oferecidos são Xerox (Camp Lur’ning), Celemi (simulação Tango), Steelcase (Win Room), US West (Global Village Labs), Hermann Hospital, e Gillette.

Em relação à Celemi, as autoras realçam o facto de a metodologia usada endereçar os habituais requisitos durante a aquisição de novo conhecimento:

  1. “Acordem a minha curiosidade! Deixem-me ver por mim própria o que é assim tão interessante.
  2. Dêem-me apenas a informação necessária, nem mais, nem menos.
  3. Deixem-me pensar na informação, discuti-la, trabalhar com ela, de forma a poder tirar as minhas próprias conclusões.
  4. Ajudem-me a ver todo o contexto de forma a ter um entendimento completo.
  5. Ajudem-me a ser capaz de aplicar o que aprendi para poder construir sobre isso e não o esquecer!”

“O conhecimento difundido imortaliza-se.” Esta frase de Sir James Makintosh abre o capítulo dedicado à fase da contribuição, geralmente chamada de partilha por outros autores.

Os imperativos deste fase são:

  • motivação – as pessoas têm vontade de contribuir o seu conhecimento;
  • facilitação – existem sistemas e estruturas para suportar esta contribuição; e,
  • confiança – as pessoas entendem e respeitam o valor do conhecimento contribuído.

Relativamente à motivação, as organizações deparam-se, essencialmente, com dificuldades na remoção de barreiras, fazendo as pessoas entender que ao contribuir podem também beneficiar, nem que para isso se tenha de negar acesso a quem não participa na construção de um conhecimento colectivo e partilhado.

Oferecer aos empregados tempo e espaço para contribuir, criar funções dedicadas ao suporte deste processo, e suportar a transferência (também) de conhecimento tácito através de, por exemplo, redes organizacionais, são as propostas das autoras para que o imperativo “facilitação” seja realizado.

Para incentivar a partilha de conhecimento, são apontadas três formas: prever algum tempo na semana de trabalho de cada empregado para a contribuição de conhecimento reutilizável, encorajar as pessoas a passear pela intranet corporativa lendo e dando resposta ao material lá incluído, e “pagando” ao empregado o tempo usado contribuindo para capital intelectual da organização.

As narrativas e a captura de conhecimento por pessoas especializadas são técnicas referidas para a transferência de conhecimento tácito, enquanto que outras técnicas são apontadas para a construção de teias organizacionais.

A importância da confiança, é finalmente salientada, sendo os principais desafios: suportar contratos de reciprocidade, criar políticas claras para a utilização de bens intelectuais, permitir que os empregados publiquem o seu próprio conteúdo, e deixar que haja sobreposições nas redes de confiança.

Os casos aqui apresentados para ilustrar as ideias expostas são a Hewlett-Packard (vendem conhecimento a outros grupos), Sun Microsystems, Booz Allen & Hamilton (KOL – Knowledge On-Line), e IBM Global Services (reutilização de conhecimento, e comunidades de prática – como as criar, gerir e avaliar).

O sétimo capítulo é dedicado à avaliação e aponta os seguintes imperativos:

  • perspectiva – expansão da teoria organizativa para capturar o impacto do conhecimento no seu desempenho; e,
  • integração – incorporar novas estruturas, processos e métricas no processo de gestão.

Um dos grande desafios do primeiro imperativo é a identificação de novas formas de capital organizacional, e é na justificação deste desafio que as autoras propõem uma definição para “bem”, “capital”, e “bem baseado no conhecimento”.

As autoras falam ainda neste capítulo da diferença entre molduras e processos de gestão de conhecimento: “As molduras identificam e segmentam as práticas de gestão e conhecimento em torno das alavancas estratégicas; os processos são usados para organizar e harmonizar as práticas umas com as outras e determinar como elas se ligam aos resultados estratégicos” (“Frameworks identify and cluster knowledge management practices around strategic levers; processes are used to organize and harmonize the practices in relation to one another and determine how well they are linked to strategic outcomes”).

Num dos pontos de vista partilhados por outros autores, são apontados as três abordagens aos bens de uma organização: custo (histórico ou de substituição), preço de mercado, e benefícios económicos.

As organizações mencionadas são o Canadian Imperial Bank of Commerce (que avalia empresas também em relação a bens intelectuais), Skandia, Celemi, Dow Chemical Company, Ramboll, e Danish Ministry of Business and Industry (Intellectual Capital Reporting Initiative).

A sustentação da gestão de conhecimento numa organização é o tema do capítulo seguinte, e a isso colocam-se os seguintes desafios:

  • direcção – canalizar recursos por forma a criar conhecimento;
  • conexão – criar relações que alarguem as hipóteses de sucesso;
  • reconhecimento – conseguir extrair valor do conhecimento; e,
  • reciprocidade – atingir uma relação bilateral entre a organização e os seus membros.

No que diz respeito aos recursos intelectuais de uma organização, as autoras elaboram sobre uma matriz de capital intelectual onde consideram que este pode ser classificado, num eixo, como possuído ou requisitado, e noutro eixo, como fácil ou difícil de gerir sob o ponto de vista da extracção de valor.

O papel do Chefe de Conhecimento (CKO – Chief Knowledge Officer), as suas funções e as suas características, foram objecto de um estudo aqui referido. Parte do resultado desse estudo é um modelo que localiza um Chefe de Conhecimento em quatro quadrantes: empreendedor, ambientalista, consultor, e técnico (por esta ordem respectiva). Ainda relativamente ao papel do CKO, as autoras apresentam testemunho de uma antiga CKO do NatWest (instituição bancária inglesa). Este texto, embora pequeno, realça pontos muito interessantes, nomeadamente o da criação de uma intranet muito má cujo objectivo era provocar o aparecimento de opiniões que levassem à construção de uma intranet mais perto das necessidades de quem a iria usar.

A criação de alianças com outras organizações (eventualmente concorrentes) para a entrada num mercado onde sós não conseguem entrar, e a valorização do indivíduo enquanto um todo, incluindo as experiências e actividades que realiza fora do local de trabalho, são mais dois aspectos que merecem destaque neste capítulo.

O World Bank, a Dow Chemical Company (grupo de gestão de bens intelectuais), a ProGroup, a The Ritz Carlton Hotel Company, a Massey Ferguson, o Mutual Group e, finalmente, a Chinaberry Book Service, são as organizações usadas para exemplificar boas práticas de sustentação da gestão de conhecimento.

Finalmente, a última fase da abordagem estratégica, a dispensa de conhecimento, apresenta dois desafios, que representam também, as suas duas componentes:

  • evitar – o conhecimento desnecessário nem sequer chega a ser adquirido; e,
  • converter – o conhecimento que está perdido nos recursos é aproveitado.

O que as autoras transmitem aqui é a grande necessidade das organizações em se manterem atentas ao conhecimento que possuem e de que necessitam. Assim, talvez não valha a pena investir em conhecimento que não lhes traga valor ou que podem conseguir através de parcerias ou outras iniciativas do género. Além disso, os organizações devem também empreender um grande esforço para procurar o valor que existe escondido no conhecimento que possui e tentar retê-lo da melhor forma. Um dos exemplos aqui apresentado é o da Harvard Pilgrim Health Care. Depois de chegar à conclusão de que era importante reter o conhecimento das pessoas quando estas saem, esta empresa lembrou-se de comprar o seu conhecimento. Assim, antes de saírem, as pessoas preenchem um formulário onde tentam transmitir o seu conhecimento. Esse formulário é avaliado por um grupo de colegas que lhe atribui um valor monetário, pago de seguida ao seu “anterior dono”. A este pagamento a empresa chama “knowledge bounty“.

A Monsanto, a Ernst & Young, e a Kodak são também apontadas como exemplo pela forma como dispensam conhecimento, conseguindo, ao mesmo tempo, os benefícios e valor que desejam.

Depois de nos terem conduzido por cada uma das fases, as autoras convidam-nos para um capítulo final em jeito de conclusão. Aqui elas propõem-se olhar para a gestão usando o conhecimento como lente de visão. Aquilo que vêem é:

  • um gestor que não oferece conhecimento, mas gere os processos através dos quais as pessoas o usam;
  • empregados que parecem clientes e clientes que parecem empregados (as organizações fazem o que podem para reter os seus empregados, enquanto que procedem a criteriosas selecções para encontrar clientes com quem possam estabelecer relações duradouras);
  • empregados vistos como voluntários;
  • fronteiras de organizações que se esbatem;
  • a utilização da medição e da avaliação em bens intangíveis;
  • o fazer sentido da informação disponível como uma forma de arte;
  • o reaparecimento dos gestores intermédios, fazendo a ligação entre os gestores de topo e a linha da frente;
  • a confiança como uma valiosa moeda de troca;
  • a tecnologia como um contexto de ligação; e,
  • opostos que se diluem.

Não sei se este é o único livro do género como as autoras advogam na capa, já que não pretendo conhecê-los todos. O que sei é que este trabalho é, sem dúvida alguma, uma preciosa ajuda para quem deseja pensar, ou repensar, a estratégia de conhecimento da sua organização. As ideias das autoras e das pessoas convidadas, os exemplos concretos e relevantes, e os questionários de diagnóstico e orientação, são, para mim, os aspectos que valorizam este livro.

The Knowledge Management Fieldbook - capaSobre o livro:
The Knowledge Management Fieldbook
Wendi R. Bukowitz e Ruth L. Williams. Financial Times – Prentice Hall, UK, 1999.

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