Gerenciando Conhecimento (Jayme Teixeira Filho, 2001)

Gerenciando Conhecimento

Gerenciando Conhecimento - capaSão raros os trabalhos originais em língua portuguesa sobre gestão de conhecimento. O livro “Gerenciando Conhecimento” é um desses e revelou-se uma agradável surpresa.

Dedicado a todos aqueles que pretendem entender a importância do conhecimento do desempenho das organizações, este livro organiza-se em torno de quatro capítulos principais (conceitos essenciais, aplicações, implantação, e perspectivas) e faz-se acompanhar de um CD-ROM e de uma página web.

O primeiro capítulo oferece, segundo o autor, conceitos básicos para o melhor entendimento do restante conteúdo. Muitas vezes, considero estes capítulos introdutórios bastante maçadores: carregados de definições e teorias demasiado simples e básicas para serem consideradas interessante por alguém. Contudo, confesso que achei este primeiro capítulo verdadeiramente interessante e digno de total atenção. O autor começa o seu percurso por uma abordagem histórica, localizando a informação e o conhecimento no panorama mundial, nacional e organizacional e justificando o crescente interessa pela gestão de conhecimento com a rotatividade das camadas hierárquicas superiores, a necessidade de integração de processos, e a necessidade de descentralizar a tomada de decisões.

As formas como o conhecimento é criado e se transmite no seio de uma organização são apresentadas talvez, neste caso, para aqueles que só agora entram em contacto com este tema.

A filosofia surge neste capítulo como um verdadeiro suporte à compreensão do conhecimento, da estratégia, da mudança, e outros assuntos igualmente importantes.

Por que uma organização é aquilo que os seus colaboradores permitam que ela seja, é necessário dar-lhes possibilidade para atinjam os seus objectivos. Assim, é necessário considerar a estratégia e a transformação organizacional, a arquitectura organizacional e os processos, a aprendizagem organizacional, os processos de decisão, a qualidade e o marketing, a gestão de projectos, o controle orçamental, a cultura da organização, e o stress e a qualidade de vida.

Defendo que ainda estamos longe de ter equipes de gestão de conhecimento nas organizações, o autor entra no assunto do capital intelectual. Recorre ao trabalho de Leif Edvinsson e de A.D. Cattani; fala na Teoria do Capital Humano que se orienta segundo duas perspectivas (a organizações precisam de colaboradores mais qualificados, e os indivíduos necessitam de se auto-desenvolver para aumentar a sua empregabilidade); refere autonomia e participação (autonomia é liberdade de acção, participação é o envolvimento no planeamento e execução das tarefas); aponta técnicas onde ambos surgem (administração por objectivos, benchmarking, desenvolvimento de equipes, malha da gestão, downsizing, empowerment, TQM, reengenharia, tercearização, e teletrabalho); e, fala dos profissionais da informação. Relativamente a estes últimos, são dados alguns exemplos e são referidos os três aspectos que traduzem a qualidade da informação: integridade, precisão, e completude.

Para finalizar o primeiro capítulo, o autor aborda o tema das organizações aprendentes. Segundo ele, existem três grandes problemas que se colocam: a subjectividade, ambiguidade e incompreensão do processo de aprendizagem, a política da organização que pode advogar a aprendizagem contínua dos seus colaboradores enquanto bloqueia a utilização do novo saber, e a pouca flexibilidade de algumas organizações que não lhes permite crescer ainda que o desejem.

Nota-se, nesta parte, uma preocupação do autor em sugerir formas de avaliação. Assim, ele sugere formas de avaliar uma organização que se diga aprendente (através de uma análise aos recursos alocados à aprendizagem, à inclusão da aprendizagem nas métricas de desempenho e remuneração, e à logística dedicada à aprendizagem) e de avaliar indivíduos, equipes e organizações em termos do seu percurso. Diz o autor que, relativamente a esta última abordagem, estamos a considerar um processo a longo prazo, mas “também é de longo prazo o processo de aprendizado verdadeiro”.

Numa onda verdadeiramente prática, o autor conclui o capítulo sugerindo os pontos que uma empresa precisa considerar para a sua evolução, e iniciativas a realizar para endereçar as questões relativas à gestão de topo, à gestão intermédia e à linha da frente.

O segundo capítulo abandona as grandes incursões filosóficas e apresenta um carácter bem mais prático.

Depois de afirmar que a vantagem competitiva será sempre o aspecto analisado para validar um investimento na gestão de conhecimento, o autor afirma que a relação entre estas se concretiza em vários aspectos, mas em especial, nas pessoas, nos processos, na tecnologia, e na informação.

Relativamente às pessoas, é necessário ter consciência do conhecimento que reside em todos os trabalhadores da organização. É essencial aproveitar o que cada um tem para dar e saber a quem recorrer em caso de necessidade.

“Há dois aspectos especiais em relação aos processos organizacionais na abordagem da Gestão de Conhecimento: memória organizacional e avaliação de melhores práticas.” É importante que as organizações consigam identificar e registar as suas melhores práticas.

A tecnologia surge, nas iniciativas de gestão de conhecimento apenas como um suporte que apenas traz vantagens quando usado de forma inteligente.

Finalmente a informação necessária relaciona-se com concorrentes, fornecedores, clientes, novas empresas, produtos substitutos, e agentes reguladores.

O modelo de Pine e os seus quadrantes (produção em massa, melhoria contínua, inovação, e costumização em massa) são depois sugeridos como forma de interpretar a estratégia das organizações. É nas organizações (ou nas unidades) que se orientam para uma estratégia de costumização em massa que a gestão de conhecimento pode ter mais impacto, ajudando à personalização do produto final de acordo com as necessidades individuais de cada pessoa.

De seguida, Jayme Teixeira Filho fala de inteligência competitiva (“o conjunto de processos e ferramentas para selecionar, analisar, comunicar e gerenciar as informações externas à empresa”) e da forma como esta condiciona os resultados obtidos. Os factores essenciais para o sucesso de um processo de inteligência competitiva são a regionalidade, dinamismo, regulamentação, concentração, e integração. Ainda relativamente à inteligência competitiva o autor apresenta uma pequena descrição do seu uso em alguns países, tais como o Japão, os Estados Unidos, a Suécia, e o Brasil.

Para finalizar o capítulo são apresentadas sugestões de como a gestão de conhecimento pode ser aplicada às pequenas empresas e que resultados podem elas esperar. Nomeadamente, diz o autor que os principais objectivos que uma pequena empresa pode ter com um sistema de inteligência competitiva são: a obtenção de informação para apoio à decisão, o apoio a projectos, o apoio a treino, e uma aprendizagem contínua.

Sob o título “Implantação” o terceiro capítulo leva-nos numa viagem pelas preocupações e fases de um projecto de gestão de conhecimento e pela tecnologia enquanto elemento presente num tal projecto.

Neste capítulo o autor afirma a dificuldade que os profissionais da tecnologia têm nas tarefas de gestão e aponta os seus objectivos.

Depois de um pouco de futurologia, é vez e falar de CRM (gestão do relacionamento com clientes). Assim, é apresentado um mini glossário de termos relacionados, uma sequência de etapas num processo de CRM (pesquisa, planeamento, estímulo, captura, análise, e monitorização).

De seguida somos conduzidos para a arquitectura de informação associada à gestão de conhecimento, sendo referidos os aspectos a considerar antes da sua definição (utilizadores, interface, controlo de acesso, pesquisa, aplicação, comunicação, repositórios). De mãos dadas com a arquitectura de informação vem a tecnologia que ocupa o resto do capítulo.

Não valendo de nada só por si, a tecnologia tem, antes de mais, de estar devidamente alinhada com a estratégia da organização. Só assim se pode almejar à vantagem competitiva. Durante o planeamento tecnológico, é possível identificar três fases, cada uma com as seguintes actividades:

  • identificação de oportunidades (prospecção de novas tecnologias, pesquisa de fornecedores, contacto com utilizadores, avaliação de produtos);
  • interiorização da tecnologia (escolha de parceiros, preparação da gestão, reciclagem técnica, projecto-piloto, aquisição, treino, terceirização, implantação); e,
  • avaliação (avaliação do impacto organizacional, análise do impacto no mercado, identificação de perspectivas de evolução).

Relativamente ao processo de implantação propriamente dito, são apresentados alguns princípios que podem ser críticos para o seu sucesso, são identificadas as etapas para a definição da arquitectura de informação, são sugeridos os passos para a definição de uma equipa que lidere a gestão de estratégica do conhecimento, e, finalmente, são ainda avançadas as fases de um projecto-piloto.

O capítulo termina com algumas ideias sobre gestão de projectos de gestão de conhecimento (a estratégia mais simples é a que tem maiores probabilidades de vencer, a estratégia, a estrutura, a cultura e a tecnologia condicionam o desenrolar dos projectos, e a memória organizacional é fundamental) e com a oposição da estratégia de codificação à de personalização.

Este capítulo apresenta listas de empresas que fornecem produtos ou serviços de gestão de conhecimento e CRM, bem como de empresas que encabeçam o movimento de implementação de gestão de conhecimento.

Dado que o último capítulo é, na realidade, um sumário de tudo o que anteriormente foi dito, o capítulo quarto é, efectivamente, o final.

Nele o autor afirma o surgimento de iniciativas de gestão de conhecimento pontuais na imensidão do tecido empresarial mundial, e afirma que “no Brasil a área é ainda incipiente”. Sugere também alguns exemplos de projectos na área da gestão de conhecimento e da inteligência competitiva: memória organizacional, gestão de processos, comunicação intra-empresarial, e-business, e formação dos trabalhadores do conhecimento.

O perigo do conhecimento vir a servir para acentuar, ainda mais, as diferenças entre ricos e pobres (sejam eles países, regiões, ou classes sociais), é aqui mencionado.

O comércio electrónico é o exemplo da “nova economia” apresentado. Sobre ele, o autor reflecte cuidadosamente, apresentando as suas características, o seu modelo integrado, e a sua força.

As comunidades virtuais surgem de seguida, como outro exemplo da nova realidade económica, mas também como possível ferramenta numa iniciativa de gestão de conhecimento.

Nas suas reflexões finais, Jayme Teixeira Filho afirma a sua ignorância sobre o futuro da gestão de conhecimento (“O futuro só se define completamente quando se torna presente.”). Para ele a gestão de conhecimento é uma área nova que deve ser considerada. Porém, o seu amanhã depende das acções de quem hoje opera no mundo organizacional.

O livro faz-se acompanhar por um CD-Rom e por um site web (www.gerenciandoconhecimento.com.br). O site tem actualização contínua e vai incluindo observações de leitores. O CD-Rom revela-se uma grande fonte de informação. Nele poderá encontrar pequenas descrições de casos de estudo, artigos escritos, na sua maioria, pelo autor do livro, apresentações, algumas das listas apresentadas no livro (listas de fornecedores de soluções de GC, por exemplo), alguns exemplos de aplicação, e ainda uma lista bibliográfica comentada.

Nota-se, em alguns pontos do livro, alguma publicidade à empresa onde o autor desempenha funções de consultor. Mas fora isso, devo ainda gabar a coragem de escrever um livro que aponta empresas concretas como exemplos de fornecedores. É um tipo de informação de grande valor para quem adquire o livro, mas que rapidamente e desactualiza. Como comentário final, devo dizer que fiquei agradavelmente surpreendida com a qualidade geral do livro. Agradou-me, também, a forma como este é complementado com o CD-Rom e o web site: ilustrações da componente multimedia que o autor refere durante o seu trabalho.

Gerenciando Conhecimento - capaSobre o livro:
Gerenciando Conhecimento
Jayme Teixeira Filho. SENAC, Brasil, 2001.

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