Portugal: O Pioneiro da Globalização é um livro sobre a forma como os portugueses recorreram a práticas hoje chamadas de gestão de conhecimento para iniciar o primeiro movimento de globalização da História. Neste livro os autores provam Portugal como o líder de um ciclo longo hegemónico e recorrem aos ciclos Históricos para sugerir possíveis cenários para o futuro próximo.
Nascimento Rodrigues e Devezas partiram para este livro com cinco objectivos principais:
- mostrar que a História não é um acumular de factos aleatórios e fortuitos
- mostrar o papel da China e de Portugal no processo evolutivo e irreversível da globalização
- mostrar o pioneirismo de Portugal no processo que iniciou um sistema de trocas à escala global
- mostrar que utilizando uma metodologia sistémica é possível conceber cenários para o futuro
- mostrar que os acontecimentos da História de Portugal deixaram um legado de conhecimento que, olhado com as lentes do presente, pode ser usado para condicionar o futuro.
No contexto deste livro, globalização é “um processo evolutivo, irreversível, multidimensional, com um forte componente histórico a longo-prazo e, finalmente, transformacional” (p 23).
O primeiro capítulo resume os conceitos associados às ondas de Kondratieff e aos longos ciclos hegemónicos propostos por Modelski-Thompson.
As ondas de Kondratieff, ondas K, com duração aproximadamente de 60 anos (duas gerações no que diz respeito à taxa de aprendizagem e ritmo de amadurecimento humanos), estão directamente relacionadas com o crescimento económico e a inovação. Assim, uma onda K começa com o pico da economia, segue com a recessão, é marcada por um cluster de inovações radicais que não evitam um fosso económico mas que sustentam a recuperação à medida que a sociedade as aceita e adopta.
Os ciclos longos mundiais permitem um olhar global, evitando as comuns perspectivas fragmentas e centradas em aspectos culturais, tecnológicos, económicos ou políticos. Estes ciclos têm uma duração aproximada de duas ondas K.
O segundo capítulo debruça-se sobre a forma como Portugal sucedeu na construção de sistemas, isto é, no “desenvolvimento de um conjunto de componentes que permitam a exploração plena de uma janela de oportunidade” (p 48). A construção de sistemas requer o planeamento, a antecipação, a inovação e a aprendizagem, aspectos, todos eles, presentes na expansão portuguesa.
A História portuguesa, nomeadamente no período da expansão, revela um comprometimento científico que, como Carlos Zorrinho diz no portfolio de testemunhos final, constituiu a primeira Agenda de Lisboa. Nesta altura, Portugal criou o primeiro think tank, conhecido com a Escola de Sagres, e que reuniu peritos de várias disciplinas e várias nações com o objectivo de inovar e pensar a expansão por mar. Para além disso, Portugal adjudicou trabalho científico na Europa e criou uma comissão científica para aperfeiçoamento dos instrumentos de medição que se viriam a revelar cruciais nas viagens de Portugal além-mar.
A criação de um war room e a inovação incremental (melhorando, com intento, objectos e ideias existentes) foram mais duas das acções que mostram uma estratégia concertada de gestão de conhecimento. De acordo com os autores, Portugal “inovou na arte de inovar” (p 132).
O capítulo quatro prova, matematicamente, que Portugal dominou duas ondas K (K9 e K10), isto é, um ciclo longo.
Os três capítulos seguintes resumem a História mundial desde o tempo do domínio português até ao presente com o intuito de contextualizar o capítulo que se segue.
No capítulo oitavo, os autores sugerem que se atentarmos ao carácter cíclico dos acontecimentos Históricos, é possível, de acordo com factores objectivos e subjectivos de observação, avançar cenários para acontecimentos futuros.
Assim, e se considerarmos como aspectos objectivos a onda K que agora inicia, o seu pico deverá ocorrer em 2030. Até lá serão “três décadas de crescimento económico” em que se consolidam as invenções relativas às tecnologias de informação e comunicação. Nessa altura ocorrerá também um ponto crítico no ciclo longo corrente.
No campo subjectivo há que referir quatro factores que dominam a atenção mundial: a questão ambiental, o terrorismo mundial, os caminhos da globalização, e a emergência de novas potencias.
Tudo isto pesado, os autores, sugerem três possíveis cenários para o pós-2030:
- os Estados Unidos renovam a sua liderança do ciclo hegemónico
- organizações internacionais e multipolarismo limitam influência e poder da superpotência
- risco de uma guerra de confronto à escala mundial da qual pode surgir um outro líder que haja sido capaz da “construção de sistemas”.
Daqui, os autores prosseguem para algumas lições que se podem retirar da análise cuidada da História. Apesar de não o fazerem, náo deixaria de ser interessante olhar para estas liçóes adaptadas ao panorama empresarial e organizacional. Isto é, considerar se as lições que a História nos ensina se verificam na subida e no declínio das organizações, na passagem de testemunho entre as que lideram, as que seguem e as que morrem.
O livro termina com o olhar de cinco conhecidas personalidades:
- Adriano Vasco Rodrigues
- Carlos Zorrinho
- José Manuel Freire Nogueira
- Mário Murteira
- Vasco Graça Moura.
Os capítulos três, quatro, cinco e seis, tentando focar em aspectos diferentes para os quais vários eventos, nem todos sucessivos, foram relevantes, os autores repetem-se um pouco e saltam para a frente e para trás na sequência cronológica dos factos. Apesar dos capítulos referidos em que, por vezes, me senti um pouco perdida, considero que é um livro fácil de ler. Está muitíssimo bem escrito e tem um design gráfico de muito bom gosto. A forma inteligente como Nascimento Rodrigues e Devezas cobrem mil anos de História mundial é uma lição de como fazer fast forward no papel.
Quando a Centro Atlântico sugeriu o interesse deste livro para os visitantes do portal KMOL, confesso que fiquei intrigada e surpresa. Apesar de apenas quatro capítulos se relacionarem verdadeiramente com a temática do portal (capítulos um, dois, quatro e oito), entendo o seu interesse para os apaixonados pela gestão de conhecimento, da inovação e dos aspectos sociais, políticos, tecnológicos e económicos condicionantes. É também de leitura obrigatória para qualquer pessoa que se interesse por História e de leitura recomendada para quem acredita no papel da História no futuro e para quem se orgulhe de ter um passado português.
Sobre o livro:
Portugal: O Pioneiro da Globalização
Jorge Nascimento Rodrigues e Tessaleno Devezas. Centro Atlântico, Portugal, 2007.