Este livro descreve uma abordagem estruturada e pragmática para o desenvolvimento de um digital workplace centrado nos utilizadores.

Infografia “The (Bad) State of the Digital Workplace” (do website do livro)
“Digital transformation” e “digital workplace” são duas das expressões atualmente mais badaladas no mundo da gestão. Muitas empresas compraram a ideia da transformação digital e marcam presença fiel nos muitos eventos organizados em torno desta promessa de um futuro melhor graças ao digital. Contudo, poucas já perceberam que uma efetiva transformação digital não se pode só focar na digitalização dos processos de trabalho voltados para os clientes. Como dizem os autores do livro, Oscar Berg e Henrik Gustafsson, “the digital work environment and the employee experience are the blind spots of the ongoing digitalization process”.
As organizações necessitam de colaboradores criativos e proativos mas foram desenhadas, e a maioria ainda opera, de forma a promover autómatos. Estão a ser introduzidas novas ferramentas que se juntam às existentes, sem haver uma reflexão cuidada sobre o seu encaixe e sobre o impacto que tem. Isto resulta em complexidade, fragmentação, inflexibilidade, redundância, inconsistência, e fraca usabilidade.
É fundamental desenvolver um digital workplace robusto. Os autores sugerem seis princípios que devem servir de base esse desenvolvimento: foco no valor, utilizadores no centro, holística, iterativa, co-criativa e focada nas evidências.
O quarto capítulo detalha os passos para definir uma estratégia de digital workplace que serve a sua organização e que está sempre a ser monitorizada e a evoluir.
Antes de tudo, a estratégia deve cumprir quatro critérios – ter um “dono” claro, ser compreensível, ser acionada, e conseguir consenso – e deve ser definida de forma iterativa, passo-a-passo. Os cinco passos recomendados para cada iteração são arranque (start-up), estado atual, estado futuro, mapa (roadmap) e finalização (completion).
Inspirados pelo Business Model Canvas de Alexander Osterwalder, os autores oferecem o Digital Workplace Canvas, uma forma de descrever os blocos principais de um digital workplace: visão, grupos de utilizadores, dispositivos, situações de utilização, capacidades digitais, plataformas digitais, bens informacionais e governo. Os autores recomendam que as organizações criem duas versões do canvas para apoiar a definição da estratégia: uma para descrever o estado atual e outra para retratar o estado que se deseja para o futuro.
Uma das minhas partes preferidas do livro é o modelo de maturidade do digital workplace. Uma matriz de maturidade introduz quatro perfis – novatos, conservadores, entusiastas e líderes – que são depois caracterizados de acordo com o seu estado – gatinhar, andar ou correr – em cinco áreas – visão, hábitos de trabalho, experiência, tecnologia e governo.
Para ajudar a mapear a entrega, os autores apresentam um diagrama que sumaria as principais capacidades digitais agrupadas em cinco categorias – informação, comunicação, colaboração, fluxo de trabalho e melhorias.
O livro termina com um capítulo sobre como passar de uma estratégia cuidadosamente definida para o desenho e criação do digital workplace.
O processo de design inclui a construção de um portfólio de serviços para identificar os serviços atuais (catálogo de serviços), serviços novos ou alterados (pipeline de serviços) e serviços abandonados.
O catálogo de serviços ajuda os colaboradores a saber quais os serviços disponíveis e a utilidade de cada um. Os autores comparam o catálogo de serviços ao menu de um restaurante de comida rápida em que o objetivo é uma escolha rápida do que se quer comer.
O capítulo 4 – “Developing a Strategy” – é o coração do livro. Se tem interesse em criar ou melhorar o digital workplace na sua organização, só este capítulo seria razão suficiente para agarrar este livro.
Tal como no anterior livro de Oscar Berg (Collaborating in a Social Era), gostei muito do tom prático e dos muitos diagramas apresentados.
Os autores planeiam disponibilizar um livro de trabalho auxiliar com exemplos adicionais. Entretanto, criaram um grupo de discussão que se pode aceder a partir do website do livro.
O que mais me surpreendeu
1. Definição de digital workplace
Os autores definem o digital workplace como “a digital work environment designed purposefully and holistically with the user front and center”. Opõem esta definição a outra, mais comum, do género de “all the digital tools and solutions the employees need to get their work done”.
Sinto-me desconfortável com ambas. A segunda porque se foca na tecnologia. A primeira porque, apesar de se focar nas pessoas, não é bem uma definição mas, antes, um elemento chave de um digital workplace de sucesso.
Perguntei ao Oscar Berg sobre isto e ele explicou: “We have chosen to see The Digital Workplace as an approach (the how), not a term that technically describes an employees’ digital work environment (the what).”
O próprio livro também esclarece que “Instead of focusing on what the digital workplace should consist of, we need to start with defining its purpose – what we call its mission – and then how it needs to develop to best fulfill this purpose. It is, of course, up to each organization to define the exact purpose of the digital workplace, and it requires a lot of effort to define and align it with its business strategy.”
Entendo a intenção mas ainda me parece estranho chamar definição a algo que explica o como e não o quê. Da mesma forma, nenhuma das definições reflete as necessidades do negócio e a principal razão para criar um digital workplace – ter impacto no negócio. Isto é especialmente estranho se considerar o quanto os autores defendem a necessidade de medir o impacto, relacionando-o com os objetivos de negócio.
2. Digital workplace como serviço
Os autores sugerem que as aplicações de tecnologia de informação deveriam ser consideradas como algo que presta um serviço. Como tal, deveriam ser vistas de acordo com uma lógica de serviço, i.e. o valor só é criado no momento em que o serviço é usado.
Servicification é uma tendência que significa que os produtos são cada vez mais vistos como plataformas para entrega de serviços. Mais e mais produtos são consumidos como serviços (por exemplo, carros que se alugam em vez de serem comprados). Consequentemente, não é preciso convencer as pessoas apenas uma vez (no momento da compra) mas a cada vez que interagem e experimentam o serviço para que voltem a querer os seus serviços. Isto, por seu turno, significa que é preciso entender bem os clientes e a sua experiência.
Os autores defendem que se deveria aplicar a mesma lógica na criação do digital workplace, pois é preciso convencer as pessoas a voltar mais uma e outra vez. Agrada-me esta ideia.
3. Utilizadores?
Este livro enfatiza muito a necessidade de colocar os utilizadores no centro do digital workplace. É tudo sobre a valorização da pessoa.
Assim, fiquei bastante surpreendida por ver que os autores referem-se às pessoas como “utilizadores”. É um termo bastante impessoal e que sugere alguém que usa / consome um serviço, ao invés de um participante ativo e co-construtor.
Não sei qual seria a melhore palavra, até porque pode haver nuances culturais e linguísticas. O que sei é que, como portuguesa, “utilizador” não soa bem.
4. Empatia
“Empathy is the mother of innovation.”
A empatia é a mãe da inovação, dizem os autores. De seguida, combinam esta frase com o conhecido ditado “A necessidade é a mãe da invenção” e chegam a “A empatia nasce da necessidade”.
Antes de ler este livro tinha lido o The Elemental Workplace de Neil Usher. O local de trabalho, enquanto junção de locais físicos e digitais de trabalho, desempenha um papel de relevo no trabalho e na satisfação dos colaboradores e, consequentemente, no desempenho da organização. Como tal, é surpreendente que se dedique tão pouco cuidado à definição de uma estratégia e à criação do melhor local de trabalho possível.
Acredito que o trabalho de pessoas como Neil Usher, Oscar Berg e Henrik Gustafsson dê às organizações uma visão mais sistémica e uma boa orientação no momento de criar um fantástico local de trabalho, passo a passo.
Nota: A infografia e as três imagens retiradas do livro são aqui reproduzidas com permissão dos autores e têm licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0 International License.
Nota: Este texto foi também publicado em inglês no LinkedIn.
Sobre o livro:
Digital Workplace Strategy & Design
Oscar Berg e Henrik Gustafsson. Unicorn Titans AB, Suécia, 2018.