Este não é o tipo de livros que costumo ler ou cuja temática domine a ponto de poder comentar criticamente a solidez da sua apresentação. Abri uma exceção para este trabalho de José Braga de Vasconcelos e Alexandre Barão. Em primeiro lugar, pela ligação que estes dois docentes têm com a temática da gestão de conhecimento; em segundo lugar, porque alguns dos capítulos versam sobre análise de redes sociais e fiquei curiosa para saber como o tema era abordado num livro sobre Python.
De acordo com os autores “este livro pretende apresentar a área de I&D da Ciência dos Dados e Engenharia de Conhecimento e as suas aplicação empresariais”. Arranca com uma visão geral sobre conceitos, métodos e técnicas que as organizações podem usar para extrair valor do grande volume de dados que possuem. Entre esses conceitos encontram-se os de web semântica, gestão de conhecimento, big data, data mining, análise preditiva, inteligência artificial, competências, capital intelectual, e outros.

Figura do livro Ciência dos Dados nas Organizações (Vasconcelos e Barão 2017) que propõe a relação entre dados, informação e conhecimento e sugere a gestão de conhecimento como uma evolução natural dos sistemas de informação nas organizações
No que diz respeito à gestão de conhecimento, devo dizer que fiquei agradavelmente surpreendida pois este foi provavelmente o primeiro livro (com exceção daqueles em que assinei alguns capítulos – Gestão de Empresas na Era do Conhecimento e Dá Pra Fazer – Gestão do Conhecimento e Inovação no Setor Público) em que vi falar de “gestão de conhecimento” e não de “gestão do conhecimento”. Em 2007, aqui no KMOL, tive oportunidade de explicar porque considero mais correto usar “gestão de conhecimento”. Já foi há muito tempo mas ainda mantenho a minha opinião.
A definição que José Braga de Vasconcelos e Alexandre Barão oferecem para gestão de conhecimento é que não me agrada tanto. Começam por dizer que é “uma gestão de recursos organizacionais, de modo a utilizar e capitalizar o conhecimento das pessoas, dos grupos de trabalho e da própria organização” (p 46) para depois falarem de “um processo sistemático de identificar, criar, atualizar e aplicar conhecimento que seja estratégico nas organizações” (p 53).
Para além disso, posicionam a gestão de conhecimento como uma evolução natural dos sistemas de informação nas organizações – “A preservação e integração de diferente, mas relacionado, conhecimento organizacional é o requisito-chave do desenvolvimento efetivo de práticas de GC.” (p 46) – e focam o papel da GC na explicitação do conhecimento organizacional – “um dos objetivos principais da GC nas organizações é a conversão sistemática de conhecimento tácito em conhecimento explícito, para tornar possível a sua disseminação e preservação na organização”.
Apesar de alinhada com a de muitos profissionais e organizações, esta visão é reducionista e perigosa porque, na realidade, é impossível explicitar todo o conhecimento. Por isso a GC deve considerar outros objetivos como, por exemplo, aumentar ou acelerar a circulação de conhecimento tácito para que possa ser interiorizado por mais pessoas na organização.
O capítulo 4 introduz o tema da análise de redes sociais nas organizações. Os autores recorrem a Faust & Faust (1994) para descrever uma rede social como constituída por um conjunto finito de atores e respetivas relações, servindo a análise de redes sociais para estudar as dinâmicas da rede e assim identificar relações e interações entre os seus membros.
São referidas as principais formas de captura e representação de uma rede social e é recomendada uma sequência de 4 processos para o diagnóstico de uma rede social: diagnosing, designing, executing e reporting. O reporting tenderá a incluir uma representação gráfica da rede, bem como os valores registados pela rede e pelos seus membros num conjunto de métricas comuns (degree centrality, eigen value, etc.).

Figura do livro Ciência dos Dados nas Organizações (Vasconcelos e Barão 2017) em que os autores sugerem uma sequência de 4 processos para o diagnóstico de uma rede social
Os capítulos 5 e 6 introduzem a linguagem de programação Python, caracterizando-a e exemplificando o seu uso para análise e visualização de dados. São referidas várias bibliotecas de módulos, sendo a numpy, a scipy, a pandas e a matplotlib como as mais adequadas para a extração, análise e visualização de dados.
No capítulo 7 os autores acompanham o leitor pelos passos de um exercício concreto de análise de uma rede social: preparação dos dados, importação da rede, análise da rede recorrendo as diversos algoritmos de visualização, recolha de indicadores, etc. Apoiam-se na ferramenta Gephi, podendo este livro ser usado como um útil manual para a sua melhor utilização.
Os capítulos 8 e 9 apresentam um conjunto de técnicas para, usando Python, fazer análise estatística e preditiva e conseguir supervised machine learning.
Alguns dos capítulos tornam-se difíceis de acompanhar porque parecem um aglomerado de conceitos listados sem que seja evidente a relação entre eles. Há também alguma repetição de ideias de capítulo para capítulo, talvez resultado de se tratar de uma obra a duas mãos. Ainda assim, trata-se de um detalhado manual para acompanhar quem precise de trabalhar dados e pretenda usar Python para o efeito.
Sobre o livro:
Ciência dos Dados nas Organizações: Aplicações em Python
José Braga de Vasconcelos e Alexandre Barão. FCA, Portugal, 2017.