Alvaro Gregorio

07. Alvaro Gregorio

Neste episódio sete da série E, entrevistámos Alvaro Gregorio, Head de Inovação do Metrô de São Paulo.

O Alvaro sabe que há um elevadíssimo grau de incerteza no sucesso dos projetos de inovação. Porém, acredita que há um ganho garantido: o crescimento do conhecimento – das pessoas e da organização.

Nesta entrevista falou de vários temas relacionados com a cultura organizacional: erros louváveis, por exemplo, e como trabalha para contornar a tendência que as organizações públicas têm para os “egossistemas”.

Entrevista gravada dia 31 março 2023.

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“Nós buscamos parceiros que venham a desafios que possam de facto representar algo novo dentro da empresa.”

Alvaro Gregorio

Sobre o Alvaro

Mestre em Educação, Administração e Comunicação e MBA on Internet Technology, é certificado em Design pela University of Pennsylvania – The Wharton School. Docente no MBA de Gestão e Engenharia de Serviços da POLI/USP, Professor no MBA FIA/USP em Gestão de Tecnologia de Informação e no Pós Graduação UX/UI: Design, Inovação e Estratégia, do Istituto Europeo di Design – IED.
No setor público desde 1981, criou para o governo paulista o ePoupatempo, o Portal Cidadão.SP, a Rede Paulista de Inovação em Governo, o inovaDay e concebeu o iGovLab, o primeiro Laboratório de Inovação em Governo da América Latina, bem como outros nove labs deste segmento.
Iniciou em 2010 a adoção do design em serviços públicos, atuando em projetos nas áreas de Mobilidade Urbana, Segurança Pública, Fazendária e Serviços ao Cidadão.
Atualmente no Metrô SP, responde pelo Departamento Corporativo de Inovação.

Pergunta de um profissional de GC

Neste episódio, o Alvaro também responde a uma pergunta da Raquel Balceiro, Profissional Master na Área de Conformidade na Petrobras:

Quando a gente está no mesmo projeto de gestão de conhecimento muito desafiador, o que é que tira o sono da gente? De que forma encontra a solução? Numa caminhada, numa ida à praia, é num passeio, é andando com o cachorro, como faz?

O que associa à Gestão do Conhecimento

O carteiro e o poeta- Pablo Neruda

Em tempos, o amigo José Antônio Carlos, o Professor Pepe, recomendou que assistisse ao filme O Carteiro e o Poeta. Trata-se de “uma emocionante história de Pablo Neruda e o seu rápido convívio com um carteiro, durante as suas férias numa ilha siciliana, em que o conhecimento tácito e explícito passam por uma intensa troca natural de desenvolvimento humano”.

No entanto, a sua melhor relação cotidiana com a Gestão do Conhecimento é um lugar: a cozinha.

“Aprendo a cozinhar algo e sei que, por mais que as receitas sejam exatas, os processos de preparo e serviço sejam idênticos, haverá algo ali que será único e exclusivo daquele momento.

Assim aprendo e, quando a vida permite, ensino. O precioso momento de trocas, experimentações, conselhos, erros e acertos acontecem nesse mesmo ambiente, carregado de temperos, aromas, contentamentos, frustrações e conversas. As descobertas e aprendizados ficam em lições aprendidas que o paladar registra, que a memória e um velho caderno guardam e que a generosidade da partilha pereniza.”

Trechos da entrevista

“Dentro das organizações, isto é facto, já deve ter percebido que nas organizações mais tradicionais como são as áreas do governo, existe sempre uma baixa conexão com o ecossistema de inovação e com a gestão do conhecimento também. Existe ali sempre um ambiente, uma cultura de autossuficiência, de que nós sabemos resolver os nossos problemas. Ela é focada no egossistema de inovação – não num ecossistema.

Esse egossistema, hoje ele é praticamente um precipício que as empresas têm de evitar porque já não se faz mais nada sozinho há muito tempo.”

Funil de ideias na edição de 2022 do Plim - Programa Laboratório de Ideias do Metrô
Funil de ideias na edição de 2022 do Plim – Programa Laboratório de Ideias do Metrô. O Plim enquadra-se nas dimensões da Cultura e Capacitação da framework do NIT

“Estamos entre os especialistas daquele tema. Só que a rede é maior do que isso. Então é por isso que as mudanças demoram a ocorrer dentro de empresas e organizações mais tradicionais como as governamentais e mesmo nas estruturas diretas de governo há uma autossuficiência, praticamente esgotada nos dias de hoje, que permitiram que essas lideranças se cristalizassem com essa mentalidade.

Então se me perguntar qual o maior desafio em gestão do conhecimento, e isso não sou só eu, você já disse isso, tantos teóricos da gestão do conhecimento já disseram: um dos pilares é a liderança e a gestão. Mas eu acho que é o principal pilar, porque dali você pode ter mudanças significativas mais rápidas.”


“O NIT é um departamento muito novo dentro da organização. O Metrô tem mais de cinquenta anos; o NIT tem três anos. Nós começámos a fazer a partir da criação de uma estrutura organizacional. A inovação e a gestão do conhecimento não pode ser um tema dentro de um departamento qualquer. Ela tem de ter um cuidado.

Então nós temos a gestão do conhecimento já estava mais amadurecida dentro do Metrô porque tem uma universidade corporativa que constrói gestão do conhecimento, constrói as bases da gestão do conhecimento para que seja utilizada pelos gestores; e do outro lado foi criado então o NIT.

Então nós criámos com uma estrutura de departamento pequeno mas com atribuições corretas. Então já tínhamos ali uma base normativa pronta, preparada e fizemos. E depois uma base física. A base física criámos um laboratório de inovação voltado para a mobilidade que é a área do Metrô, onde nós concentramos projetos dedicados à inovação nas áreas de mobilidade e estrutura organizacional.

MetroLab - Laboratório de Inovação do Metrô SP
MetroLab – Laboratório de Inovação do Metrô, onde as equipes se reúnem para o desenvolvimento de técnicas aplicadas a projetos inovadores e também para a educação corporativa

Depois uma estrutura matricial com os principais problemas da inovação e de gestão do conhecimento. Nós temos grupos formados em squads que trabalham.

O principal problema dentro da inovação, por exemplo, é ainda no Brasil a questão da contratação de inovação por parte de empresas públicas: como é que eu contrato, sendo uma empresa pública, a inovação? Temos aqui o marco legal da inovação mas ainda muito receio por parte dos gestores em trabalhar essas novidades, dizendo assim, na parte de aquisição de contratação de inovação.

Essas três estruturas, normativa, física e organizacional, deram um impulso no plano de ação de inovação. Então nós temos aqui todo um conjunto de funções dentro do NIT. Nós temos as cinco dimensões do nosso framework. Nós temos as dimensões de cultura de inovação, capacitação para inovação, projetos de inovação, prospeção da inovação e a governança.

Framework da gestão de inovação corporativa adotada pelo Núcleo de Inovação e Tecnologia (NIT) no Metrô SP
Framework da gestão de inovação corporativa adotada pelo Núcleo de Inovação e Tecnologia (NIT) no Metrô SP

Na prospeção nós fizemos um trabalho e esse é o trabalho permanente, a prospeção sempre é em permanência, mas fizemos uma organização entre a prospeção interna que é o que a casa tem como possibilidades de inovação, como é que se faz a metodologia dessas demandas; vamos para fora com a prospeção externa para enxergar oportunidades e aí eu tento dar um match entre necessidades e oportunidades.

Fora isso a gente está começando agora uma parte de prospeção de futuro, de saber que cenários nos apontam tanto na área de mobilidade, quanto em tecnologia, quanto em estruturas organizacionais.

O que nós chegamos destes três anos foi, nós temos vários termos de convénio e de cooperação técnica, científica e académica com as universidades, as principais universidades aqui de São Paulo – e não são só termos assinados, nós temos trabalhos que são desenvolvidos com professores e alunos. O Metrô passou a ser um objeto de pesquisa por parte da área académica; nós temos também conexão com parques tecnológicos, com as aceleradoras, inovação, as startups que nos ajudam muito nessa busca, nesse encontro de oportunidades e necessidades.”

MetroHub
MetroHub é o nosso posto avançado de inovação, instalado dentro do Parque Tecnológico de São José dos Campos (cidade que fica a 100 quilómetros da cidade de São Paulo), conectando o Metrô com mais de 150 startups, 9 universidades, empresas de grande porte, laboratórios e centros de pesquisa em diversas áreas

“Quando começámos a falar disso nós pregávamos no deserto. Não havia quem nos ouvisse e quando nos ouviam não entendiam.

Hoje graças a trabalhos como o teu, como esse podcast, com tudo o que já publicaste acho que existe um pouco mais de perceção por parte das pessoas, principalmente se a gente considerar o bottom-up como estratégia.

Agora é necessária uma estratégia top-down, para isso os executivos, as lideranças vão tomando consciência e hoje já não há mais aqueles ouvidos moucos. Hoje há uma necessidade de aprender isso já percebida, tanto em gestão do conhecimento como em inovação.

Então acredito que todo o empenho destes quinze anos não tenha sido em vão mas como eu me apresentei aqui há alguns minutos, eu sou um esperançoso.”


“Existem algumas coisas que não são grandes atos, não são alvos de premiação, não são alvos de trazer desenvolvimento económico super imediato mas elas são de transformação organizacional e isso para mim não tem paga, como não teve paga a manifestação do cidadão que fala assim: ‘isso aqui poderia ser diferente e o Governo já fez’.”


“A gente faz uma prospeção interna para tentar encontrar necessidades e oportunidades e juntá-las. O que a gente quer agora é começar a fazer uma prospeção de futuro.

O cenário que nós encontramos recentemente na pandemia… Ela trouxe um choque para o Metrô de São Paulo – e deve também ter trazido para o Metrô de Lisboa – que foi uma queda de arrecadação imensa, foi um colapso mundial nesse sentido, da qual foi difícil estar preparado.

No Metrô caiu a receita a 70%. Então o que nós jogamos melhor, inclusive para poder conduzir essa parte de prospeção, porque a prospeção era na estratégia empresarial e do comportamento das áreas científicas e de mercado. O que a gente quer agora é prospetar um pouco de futuro na formação de cenários e poder alimentar um pouco a estratégia de inovação, de gestão do conhecimento para esses cenários, e colaborar assim.

Então nós estamos com essa meta de desenvolver a prospeção de futuro e cenários de inovação; com o estabelecimento de macro-processos de inovação e gestão do conhecimento. Na universidade corporativa do Metrô, nós temos ali uma trilha de inovação e de gestão do conhecimento. Nós já estamos influenciando essa trilha também trazendo novas ideias e novas formações. Porque uma coisa é você ter uma universidade corporativa que se preocupa em capacitar o profissional hoje. A gente tem que começar a capacitar um profissional para daqui a cinco anos.”


A gestão de conhecimento “é a forma de tornar perene e vivo – e portanto tem esse movimento de mudança, de transformação – aquilo que é humano. Você pereniza uma construção que você faz, deixando que o tempo e os outros a modifiquem, a criem, recriem, mas existe ali uma semente da minha contribuição, existe uma semente que veio de onde eu também peguei sementes.”


“A gestão do conhecimento ela ajuda à construção, ajuda à criação, ajuda à inovação – ela é importantíssima para a inovação -, não só da organizações mas de um mundo melhor.”