Os dez episódios da série E do podcast KMOL foram dez entrevistas a profissionais lusófonos de gestão de conhecimento (GC). Essas entrevistas deixaram clara a paixão dos entrevistados pela GC e mostraram que a gestão de conhecimento é vista e implementada muito de acordo com a pessoa responsável e com o foco e maturidade da organização.
No rescaldo dessa série de entrevistas, este episódio bónus é uma compilação das definições apresentadas pelos dez profissionais.
De acordo com Ana Neves, que faz a cola das definições apresentadas, talvez pudesse fazer sentido haver uma única definição de gestão de conhecimento. “Ao mesmo tempo, se conseguirmos adaptar a nossa abordagem à gestão de conhecimento de acordo com as dores, as prioridades, a cultura e a maturidade da organização, talvez consigamos maior tração para os nossos esforços e, consequentemente, melhores resultados.”
E deixa três convites:
- “Ouça estas definições e perspetivas. Pense quais as que podem fazer mais sentido na sua organizações, desafie-se a descobrir ângulos que ainda não está a explorar, identifique argumentos interessantes para usar…”
- “Se a sua atividade está relacionada com a gestão de conhecimento ou se gostava de encontrar argumentos para melhorar a gestão de conhecimento na sua organização, faça-se um favor e vá ouvir as 10 entrevistas. Acredite que não se vai arrepender!”
- Depois de ouvir (ou ler) as definições partilhadas pelos entrevistados, partilhe na caixa de comentários desta página o que é, para si ou para a sua organização, a gestão de conhecimento. “Seria muito interessante enriquecer ainda mais este mosaico de perspetivas.”
Segue-se uma transcrição quase integral deste episódio bónus, começando com as palavras da Ana Neves.
Transcrição
Há quase 25 anos que trabalho com gestão de conhecimento. Neste percurso, fui desenvolvendo uma definição de gestão de conhecimento mas nunca a digo sem realçar que se trata da minha definição, uma definição que reflete a forma como eu vejo a GC, os aspetos que eu considero quando trabalho um projeto de GC. Isto não quer dizer que com todos os clientes eu consiga trabalhar todos os elementos da GC: porque nem todas as organizações vêm a GC da mesma forma, porque nem todas sentem necessidade de todos os elementos, nem todos têm a cultura necessária ou o espaço e interesse para a criar…
Estas abordagens, prioridades e perspetivas diferentes ficam bem visíveis quando ouvimos como os 10 entrevistados descrevem a gestão de conhecimento.

Comecemos por ouvir Viviana Garcia, Digital Workplace Coordinator na UEFA:
“Vejo a gestão de conhecimento muito pela definição da própria, ou seja, pela captura e distribuição de informação, de data, de conhecimento. Não tenho assim uma visão muito pessoal, foco-me um bocadinho nesta, se calhar, leitura mais académica, mas eu acho que isso ajuda bastante a manter o foco naquilo que realmente é importante e naquilo que queremos fazer e nos projetos que queremos desenvolver.”

Também Sara Sá Leão, Lead Knowledge Manager na Dynatrace, nos propõe uma visão muito focada no processo, nas atividades da própria gestão de conhecimento:
“é uma tomada de consciência que há um ativo invisível nas organizações que é o conhecimento. A partir daí há uma série de técnicas, talvez há muita arte também para garantirmos que conseguimos capturar, partilhar e reutilizar esse conhecimento, de forma a acrescentar valor e de forma sustentável e também de forma a isso contribuir para a melhoria contínua e inovação das organizações”

Raquel Balceiro, Profissional master de Conformidade na Petrobras, também salienta a importância do conhecimento propriamente dito, considerando que a gestão de conhecimento é a atividade que se foca no seu cuidado:
“A gestão de conhecimento para mim, é um olhar da gestão para mais um ativo que é extremamente relevante, que é o conhecimento, que muitas vezes é visto por todos como um ativo de suma importância mas não é tratado com a devida urgência, muitas vezes“
Para Adriana Jacinto, Coordenadora da Equipa de Gestão de Conhecimento e Biblioteca no Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a gestão de conhecimento está ao serviço desse ativo precioso que é o conhecimento.

“Portanto, a gestão de conhecimento é isto: é este ciclo em que se tira, se documenta e se cataloga, se põe à disposição o conhecimento. Para mim é isto, em que não começamos do zero mas sim pomos as experiências e os conhecimentos uns dos outros à disposição de quem os precisa, para enriquecer aquilo que está a ser produzido em termos de conhecimento, aprendendo lições e inserindo essas lições para poder aplicá-las, para poder devolver novas metodologias ou ajustar as metodologias que já desenvolvemos e que adaptámos, e que adotámos, bem como os standards que utilizamos para o nosso trabalho.”
Esta ideia de coconstrução de conhecimento, e o papel da gestão de conhecimento como facilitadora, vem também nas palavras de Alvaro Gregorio, Head de Inovação do Metrô de São Paulo, para quem a gestão de conhecimento…

“é a forma de tornar perene e vivo – e portanto tem esse movimento de mudança, de transformação – aquilo que é humano. Você pereniza uma construção que você faz, deixando que o tempo e os outros a modifiquem, a criem, recriem, mas existe ali uma semente da minha contribuição, existe uma semente que veio de onde eu também peguei sementes.”
E, se por um lado todas estas definições apontam para o valor da gestão de conhecimento para as organizações, Rute Viais e Victor Alves olham a GC numa ótica mais centrada nas pessoas.

Para Rute Viais, Knowledge Culture Manager numa multinacional alemã:
“A gestão de conhecimento é sobretudo para os colaboradores; para valorizar o que nós temos de melhor, que são as pessoas. E essas pessoas só vão conseguir dar o seu melhor se se sentirem no seu melhor” … “é também dar as ferramentas para as pessoas aprenderem, a discernir o que é que é importante e não é, enquanto conhecimento”
Para Victor Alves, Principal Consultant L&D na Equinor,

“A gestão do conhecimento é mais do que uma área, ela é uma habilidade. É uma habilidade que toda a pessoa, mais do que profissional, acho que toda a pessoa precisa de desenvolver.
Porque é a capacidade de você buscar, organizar, dar sentido e compartilhar e apresentar o conhecimento que você tem. Nas organizações o foco, é o registro do conhecimento, é essa formalização do conhecimento que está nas pessoas para as organizações, para que a organização não perca esse conhecimento quando as pessoas saem, mudam, etc.
A nível pessoal eu acho que, o principal foco da gestão de conhecimento é o autodesenvolvimento, buscar o seu conhecimento, buscar a informação que você precisa para adquirir e para aplicar no que você precisa”… “A gestão do conhecimento é essa ciência que dá essa estrutura e organização do conhecimento organizacional”

O fator humano fez-se também ouvir bem alto na conversa com Laura Henriques, Responsável pela Gestão de Conhecimento e da Mudança na área de Gestão de Inovação na ANACOM:
“o conhecimento antes de mais tem de ser útil (…) a quem precisa dele. E portanto é bom que aquilo que as pessoas sintam que podem encontrar na intranet, neste caso, a resposta às perguntas que têm, a informação para poder complementar alguma coisa que estejam a fazer, um nome para contactar no caso de precisarem de saber mais sobre alguma coisa. Porque a gestão de conhecimento depois também nos dá isto: dá-nos rostos, dá-nos esta ligação entre pessoas.”
Algumas das entrevistas olharam também a ideia da gestão de conhecimento do ponto de vista da equipa de GC propriamente dita. Foi o caso da entrevista a Teresa Nora, Responsável pelas áreas de Gestão do Conhecimento, Formação e Marketing no escritório da Linklaters em Lisboa.

“A gestão do conhecimento é um serviço que prestamos a uma organização. E portanto isso pode mudar bastante não só da perspetiva a quem oferece esse serviço às outras pessoas da organização, como quem usufrui e utiliza esse serviço que pode ser diferente de pessoa para pessoa: há pessoas que valorizam mais umas coisas e há pessoas que valorizam mais outras.
Eu costumo dizer que é, para mim, o mais importante na gestão do conhecimento é ter uma cultura de partilha de conhecimento e de interesse na matéria e portanto a melhor maneira de o fazer é adaptar o processo ao utilizador.”
Todos os entrevistados deixaram transparecer o papel fundamental que a gestão de conhecimento pode ter nas organizações. Thiago Ribeiro, Supervisor de Integração de Gestão do Conhecimento na Amazul, disse-o de forma bem clara:

“Eu poderia dizer que a GC é um conjunto de práticas e ferramentas para gerir, identificar, multiplicar, reter o conhecimento. Mas eu vejo que a GC é algo muito mais abrangente do que simplesmente práticas. Eu vejo ela como algo vital nas organizações. Se elas querem ter uma perenidade nos seus negócios, eu acho fundamental que as empresas vejam com bons olhos a gestão do conhecimento.”
Porém, e pegando novamente nas palavras de Laura Henriques, é importante que a gestão de conhecimento esteja alinhada com a estratégia organizacional:
“Não podemos ter a veleidade de achar que estamos a fazer a gestão de conhecimento se não conhecemos a estratégia da organização.”
Afinal, a gestão de conhecimento “é a construção de um caminho sólido com toda a organização” e é importante que o caminho seja construído de forma a levar a organização na direção que ela pretende seguir.
São várias perspetivas, que levam a várias abordagens. Com nuances diferentes, que privilegiam aspetos diferentes… Mas não são contraditórias. Complementam-se. E todas estas visões partilhadas por estes 10 profissionais ajuda-nos a criar uma visão mais completa daquilo que se fala, ou se pode estar a falar, quando ouvimos “gestão de conhecimento”.
Se ficou com curiosidade para saber qual a minha definição de gestão de conhecimento, aqui vai:
A gestão de conhecimento é uma área da gestão que trabalha processos, infraestrutura e pessoas, de forma a melhorar a criação, a troca, o acesso, a retenção, a validação e a utilização do conhecimento, com o objetivo último de contribuir para que a organização atinja os seus objetivos estratégicos.